John Frusciante PERGUNTAS & RESPOSTAS: Sobre sua evolução eletrônica e por que ele está cansado de bandas de rock.
Em entrevista exclusiva, publicada pela Billboard em 19 de agosto de 2013, John Frusciante fala sobre seu novo EP de música
eletrônica abstrata, por que ele deixou os Chili Peppers e sobre a “a parceria musical mais divertida que eu já
tive com alguém na minha vida”.
O guitarrista John Frusciante,
ausente dos palcos desde que deixou os Red Hot Chili Peppers há cinco anos,
desde então tem adotado baterias eletrônicas, sintetizadores e um computador
como seus principais instrumentos.
Hoje suas criações são confinadas
a sua sala de estar, onde Frusciante as experimenta e produz o que chama de Progressive
Synth Pop. Outsides, um EP de 20
minutos de música eletrônica abstrata que será lançado no dia 27 de agosto, consiste
em peças que ele próprio denomina “out”, que reforçam uma saída do rock
tradicional e da expectativa do público. “Eu precisei fazer, especificamente,
música que eu sabia que não venderia para aprender coisas”, disse Frusciante à Billboard
durante uma exclusiva conversa por telefone de uma hora de duração em julho
passado. “E vou continuar fazendo isso para o resto da minha vida”.
Frusciante explicou seus anos de
aprendizado e crescimento como artista solo desde que deixou a dinâmica de
banda – e por que ele nunca mais vai voltar. “Quando se trata disso,
provavelmente tenho muito mais em comum com os antigos compositores clássicos
de 1700 do que as estrelas do rock de hoje em dia”, disse ele. “Eu não penso
nem na guitarra do mesmo jeito mais. Aprendi a pensar mais como um pianista,
onde tenho uma visão mais ampla da música”. Essa visão abriu recentemente outra
porta para Frusciante, como produtor do álbum do grupo de hip hop Black
Knights, filiados ao Wu-Tang Clan. Sua primeira colaboração, “The Medieval
Chamber”, será lançado pela gravadora independente Record Collection, em
dezembro. Estes são trechos da entrevista:
Outsides começa
com uma música que inclui um solo de guitarra de 10 minutos. Esse é o mais
longo solo em álbuns que você conhece?
"Oh, não, não. Frank Zappa fez alguns solos estendidos que estão próximos dessa duração. Sim, e Jimi Hendrix também fez. Se você ouvir as gravações ao vivo de Jimi Hendrix, uma música como “Machine Gun”, geralmente tem um solo de 10 minutos com bastante frequência."
Fazer solos de guitarra requer algum tipo de estrutura, ou mesmo
prática?
"Especialmente no caso desse solo,
ele reflete a música, sabe? Digo, qualquer solo de guitarra deveria refletir a música em que está contido e não apenas existir em seu próprio mundinho. Mas isso foi o que muita gente fez nos anos 70 tocando solos estendidos, eles pareciam se perder em seu próprio mundo, então isso se tornou o que considero uma “zona de conforto” para guitarristas. Mas sobre esse solo, ele reflete a música, que é algo que Frank Zappa não estava fazendo em seus solos estendidos, pois ele iria afastar-se da música e ter uma base bem simples em que poderia facilmente solar por cima sem ter que pensar em muita coisa além da sua própria guitarra. E eu estudei
esses solos por toda a minha vida, eu os amo, mas vejo a diferença entre eles e
uma canção. Eu acho que um solo avança da maneira que uma canção avança, porque
ele é reflexivo aos acordes que estou pensando enquanto o faço, e, ao mesmo
tempo, avanço até chegar a borda que Frank Zappa costumava chegar, que é
enlouquecer com o instrumento."
Apesar de ganhar instrumentos adicionais, você continua gravando suas
músicas em casa.
"Para mim, viver e fazer música
são uma coisa só. Não é como um trabalho em que vou a um estúdio para fazer, ou
uma tarefa que tenho que estar com vontade de fazer, ou algo assim. É a coisa
que preciso fazer todos os dias. Recebi um bom conselho de um empresário há
muito tempo atrás, sugerindo que, em vez de gastar dinheiro em orçamentos de
gravação, eu deveria ter meu próprio estúdio. E com certeza ele estava certo.
[...] O rock progressivo é um estilo de música que começou com os Beatles,
onde eles começaram a incorporar aspectos do jazz, aspectos de música clássica
e aspectos de música de outras culturas no rock, e aquilo deixou evidente que o
rock era uma forma maleável de música, como o lado B de Abbey Road, em que cada música está ligada a próxima. E bandas como
Genesis, King Crimson e Yes, basicamente, para mim, estavam continuando o que os
Beatles tinham começado, desafiando a tradição, basicamente, e desafiando o
modo geral de que as coisas eram feitas. Então, eu realmente admirei o que
essas bandas fizeram em toda a minha vida, e isso realmente não era o que eu
fazia quando eu estava na banda. Nós não fazíamos músicas de 15 minutos ou nos
desviávamos muito das fórmulas tradicionais. E synthpop para mim é apenas rock
feito com sintetizadores e baterias eletrônicas. Realmente, o meu instrumento
agora é todo um mix de instrumentos."
Você toca várias coisas. Alguma coisa já intimidou você?
"Eu comprei um clarinete e queria
aprender a tocar, mas interferiu no meu canto. E achei que se eu aprendesse,
aquilo faria meu pescoço ficar tenso, pelo menos momentaneamente, até que aprendi
a respirar corretamente. Então, sim, esse clarinete ficou por aí por, tipo, um
ano e não aprendi. Sabe, essa é a beleza da tecnologia de samplear."
Como a venda de sua música através de uma plataforma como Topspin
(online) difere de ter o apoio de grandes gravadoras e distribuidores?
"Neste ambiente de música e da
maneira que ela está sendo consumida hoje, eu acho que nós estamos vendo os
efeitos nocivos do “pensamento de negócios” sendo aplicados aos artistas, e
artistas aprendendo a pensar mais como empresários e celebridades do que
músicos. Então, felizmente, eu me retirei desse mundo, e todos os dias durante
os últimos cinco anos eu pensei especificamente sobre novos lugares para ir e
encontrar novos desafios para mim. E parte disso significava que eu passaria
cerca de três anos fazendo música que eu não tinha absolutamente nenhuma
intenção de lançar. [...] Estas foram as coisas mais úteis para o meu
crescimento musical. Quando você entra em uma banda, especialmente uma banda
que é popular, você nem percebe que está fazendo isso porque é tão natural fazer,
mas basicamente você se prende a fórmulas seguras e a coisas que se provaram capazes
de vender para as pessoas. E fazendo isso, muito pouco crescimento ocorre ao
longo de um período de anos. Então eu me sinto um músico completamente
diferente hoje do que era há cinco anos atrás, com uma gama completamente diferente
de coisas que eu posso fazer e coisas que eu sou bom. Não haveria nenhuma
chance de ficar bom nesse tipo de coisas no ambiente que eu estava como um
músico de rock famoso, hoje e nesta era."
Quando foi que você percebeu que não estava mais florescendo
criativamente com a dinâmica da banda?
"Bem, como eu disse, eu sempre
quis fazer música eletrônica e eu tinha me aproximado pouco disso ao longo dos 10
anos ou qualquer que seja o tempo em que estive na banda depois de voltar [em
1998]. E isso é uma daquelas coisas que você tem que fazer todos os dias durante
anos para ficar bom. Então sempre foi algo que eu queria fazer, mas éramos tão
bem recebidos como uma banda que realmente não me ocorreu de sair até Flea vir
a mim em um momento e dizer: “Eu quero fazer uma pausa de dois anos depois
dessa turnê”. Ele me disse isso na metade da turnê [do Stadium Arcadium, em 2007], e quando disse, eu fiquei meio chocado,
porque eu pensei que nós estávamos de vento em popa, vamos manter isso rolando,
sabe? Mas quando ele disse isso para mim, minha mente começou a pensar: “O que
eu faria com esses dois anos se eu tivesse dois anos para fazer só o que eu
quisesse?”. E cerca de quatro meses depois, eu estava tão animado sobre sair da
banda que eu nem queria que fosse uma coisa de dois anos mais. Eu só sabia que eu não queria estar na
banda nunca mais, sabe? Na verdade, eu não saí até vários meses depois que
estávamos realmente na pausa, mas eu sabia que eu queria sair antes da turnê
acabar. Eu estava determinado. Porque havia tantos músicos eletrônicos que eu
adorava o que eles fizeram, e eu sabia que musicalmente eu tinha me agarrado a
uma compreensão a partir do aprendizado na minha guitarra. Mas eu também sabia
que até eu aprender a programar aquelas velhas máquinas que a Roland fez nos
anos 80, eu não ia ser capaz de realmente criar música envolvendo os princípios
musicais que eram inerentes aos que aquelas pessoas estavam fazendo. Então, no
meio da turnê, eu consegui as drum machines TB-303 e TR-606 e as carreguei de
quarto de hotel a quarto de hotel. Era toda uma nova forma de pensar, era toda
uma nova forma de criar música e era como ir para a escola de música, de várias
formas, pois isso me fez começar a ver a música de um ângulo completamente
diferente. Por um longo tempo, acho que por um ano, foi um esforço, de várias
maneiras, mas assim que fiquei confortável, assim que a turnê acabou, comecei a
configurá-lo para que eu pudesse programar um monte de máquinas de uma só vez. Naquele
ponto não havia a complexidade das coisas que eu poderia fazer, tipo, com uma
guitarra ou com alguma outra pessoa. Eu não me importava. Eu ficava feliz por
fazer a mais simples e minúscula faixa de Acid e poder tocar com os botões da
máquina. Fiquei muito feliz por estar fazendo algo que não tinha qualquer
ligação com os hábitos que eu tinha adquirido como guitarrista de rock."
Você consideraria tocar a sua nova música, mesmo que para um pequeno público?
"Não, eu não tenho interesse em
tocar ao vivo. Eu realmente não penso mais em mim como um homem de palco. Isso
nunca foi algo que veio naturalmente para mim. Foi algo que eu me adaptei, mas
nunca foi realmente uma expressão de quem eu era. [...] Eu não sou um
performer. Eu não aprecio o efeito que o público tem sobre mim, porque para mim
a música é algo que vem de dentro de mim. E música é algo que eu mergulho, e
quando estou na frente de um público, não posso ignorar o ambiente que estou e
não posso ignorar o jeito que eles fazem eu me sentir. Eles fazem eu me sentir
bem, o público. Mas, então, eu descubro que eu não estou mergulhando tanto dentro
de mim para criar alguma coisa, e sim estou mais tentando alcançar as expectativas
deles e tentando fazer algo que é divertido para eles. E isso não é só
comigo. Eu não estou interessado em conhecer as expectativas das pessoas e não
estou interessado em agradar as pessoas. Sou feliz de ter feito isso com
sucesso por tanto tempo, mas quando se trata disso, provavelmente tenho muito
mais em comum com os antigos compositores clássicos de 1700 do que as estrelas
do rock de hoje em dia, sabe? Eu penso mais em termos de criação de uma
composição completa, e isso é realmente o que me faz feliz por estar vivo e
animado para viver todos os dias, é a capacidade de criar a partir do zero uma
peça inteira de música. Estou mais confortável fazendo isso do que já estive
fazendo qualquer coisa. Isso me faz mais feliz do que tocar guitarra fez.
Então, entreter as pessoas, acho que não é a minha praia, sabe?"
Qual outro tipo de música você vai fazer este ano?
"Nos últimos seis meses, eu só
tenho feito hip-hop. Mas faz um ano que venho trabalhando com esses artistas
chamados Black Knights. E nós fizemos uma parceria muito bem sucedida. [...]
Devido à tecnologia, temos uma relação musical em que ninguém diz a ninguém o
que fazer, ninguém restringe ninguém, ninguém discute com ninguém. Meu trabalho
é fazer a música, o trabalho deles é rimar, e não ficamos no caminho um do
outro. Todos nós queremos ouvir o mesmo disco, é assim que eu penso nisso.
[...] Eu não seria mais feliz se eu tivesse, tipo, Ice Cube ou Ol 'Dirty
Bastard. Adoro os raps deles tanto quanto adoro qualquer rapper de discos
antigos que gosto. É a música que eu quero ouvir, e eu posso ir a qualquer
direção que eu quiser com ela. As regras do hip-hop são realmente agradáveis
para mim e me permitem ser completamente livre. Hip-hop, como o rock, pode
absorver qualquer estilo. E acho que pode fazer isso ainda melhor do que o rock
pode. Então eu posso fazer disso um synthpop, eu posso fazer coisas totalmente
abstratas e estranhas, eu posso fazer som puro sem melodia, eu posso fazer rock,
eu posso fazer disso o que eu quiser. É o tipo de música que eu posso ser totalmente
livre. Meu principal interesse está nos polirritmos, grooves e sons. E essa é
outra razão pela qual eu nunca estaria em uma banda de rock. Porque em uma
banda de rock você tem que atender a afinação e ao ritmo. Mas, nestes
tempos modernos, com a tecnologia musical sendo o que é, temos o dom de sermos
capazes de atender ao som e aos detalhes do ritmo. Quando você está em uma
banda, você diz ao baterista “Eu quero esse tipo de batida”, ou algo assim. Mas,
com a tecnologia, eu posso fazer exatamente a batida que eu quero fazer, os
grooves, as diminuídas, as aceleradas, tudo exatamente como eu quero, exatamente
conforme a minha imaginação e não apenas como uma espécie de cópia da minha
imaginação ou uma interpretação da minha imaginação. É realmente o que eu estou
ouvindo na minha cabeça que está saindo dos alto-falantes. Então, fazer
hip-hop, essa é a parceria musical mais divertida que eu já tive com alguém na
minha vida. E é a mais pura."
Fonte: Billboard - Agosto de 2013
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