Entrevista "perdida" de John Frusciante, conduzida por Steven Rosen (SR), no começo de 2004. O áudio da conversa foi publicado no dia 17 de novembro de 2019, até então ele nunca havia sido divulgado, porém, parte dessa conversa foi publicada na Total Guitar (UK) de abril de 2004. A tradução ficou por conta de Eloá Otrenti da Frusciante Brazil.
John Frusciante, o ressuscitado guitarrista dos Red Hot
Chili Peppers, e criador de diversos álbuns solo esotéricos, pode ser melhor
classificado como um músico minimalista, uma figura anti-guitarra que evita
solos longos, solos com mais de doze notas, a aplicação do vibrato de dedo e o
uso da barra de tremolo – apesar do seu instrumento principal ser uma Fender
Stratocaster 1962. Em seu álbum solo mais recente, Shadows Collide With People,
todas essas texturas são aplicadas, ou nenhuma delas se for o caso. Autoproduzido,
o álbum conta com John tocando guitarra, teclados, baixo, percussão e cantando.
Ele é acompanhado pelo colega de longa data Josh Klinghoffer, um multi
instrumentista por si só, que toca esses mesmos instrumentos.
Em uma tarde perfeita no sul da Califórnia, John conversou
sobre seu estilo único de tocar e escrever. Sentado em uma varanda do sexto
andar do lendário Chateau Marmont – o lugar onde John Belushi deu o último
suspiro e Johnny Depp e Hunter S. Thompson chamaram de casa por muitas semanas –
Frusciante olhou para as colinas de Hollywood Hills. Tendo suportado sete tipos
de inferno físico e mental com vícios e depressão, o músico do Chili Peppers
estava tão contente e suave como um bebê com sua mamadeira. O sol estava
brilhando e uma brisa suave acariciava delicadamente as folhas nas árvores,
John Frusciante tentou explicar John Frusciante. Nem sempre funcionou bem, mas
aqui estão aquelas ideias e lembranças.
SR: Qual sua principal motivação
para gravar um álbum solo separado do Red Hot Chili Peppers?
Eu
não escrevo letras no Red Hot Chili Peppers e eu sou um compositor. O que eu
faço no Chili Peppers tem mais a ver com colocar pequenas peças juntas por que
estou deixando muito nas mãos de três outras pessoas. Eu me considero um
compositor acima de tudo e é por isso que escrevo músicas. No Chili Peppers eu
posso escrever uma música inteira mas apenas a parte da guitarra. Eu escrevo
letras desde os onze anos e tenho ficado cada vez melhor. E tem muito mais dessa época, que não está
nesse álbum. Tinha aproximadamente catorze musicas que eram conteúdo para a
trilha sonora de Brown Bunny, filme de Vicent Gallo e cinco delas foram para o
álbum do filme. Tem The Stuff que eu fiz para Brown Bunny, é uma musica muito
triste e não deve ter bateria, apenas uma guitarra acústica e poucos overdubs
de guitarra elétrica, e o vocal. E as coisas que estavam neste álbum foram
feitas para serem produzidas de forma muito elaborada. Ficamos empolgados com
álbuns como Violator, de Depeche Mode, onde há um tipo muito extremo de
produção.
SR: Você considera a produção
desse álbum como extrema?
Estou
realmente usando o estúdio como um efeito, em vez de apenas usá-lo para uma
representação realista do que parecemos tocar juntos. Estou usando coisas como
compressão, eco e reverb de uma maneira muito extrema.
SR: Se olharmos para uma musica
como Carvel, a musica de abertura do álbum, como você descreveria o
desenvolvimento? Como a sua musica evolui?
A
primeira coisa que fizemos foi uma gravação demo da musica; a maioria das
músicas nesse álbum foram feitas em cassetes de 8-track. Era onde a maioria das
experimentações acontecia, você sabe? Como foi? Eu me lembro eu fiz uma demo
sozinho. Gravei a guitarra, Josh fez o overdub da bateria, fiz o baixo no
sintetizador e peguei meu Mellotron que tinha alguns emuladores e tentei usar
sons que normalmente não usava. Usei um som para a introdução e outros para o
verso, usei outro para a terceira sessão – tentei usar um som diferente em cada
sessão. E depois Josh e eu sempre
criamos nossas harmonias vocais quando algo ainda está na forma demo. E essa é
provavelmente a etapa final disso.
SR: Para as sessões de gravação em
estúdio como era essa rotina?
Nesse caso, Josh tinha escrito as partes de partes
então basicamente era ele e eu em uma sala, ensinando essas partes para Chad e
Josh normalmente tocava baixo e eu guitarra. Em algumas musicas eu deveria
tocar baixo então éramos apenas Chad e eu gravando.
SR: O
som e sentimento das partes de guitarra rítmica são muito únicos, de onde vem
isso? Você pode explicar sua maneira de dedilhar?
É apenas algo que vem de tocar há algum tempo.
Quero dizer que posso reconhecer a maioria de meus guitarristas favoritos tocando.
Há algo que faz com que os músculos e a pele de duas pessoas e a eletricidade
no corpo de um indivíduo não sejam como
de outra pessoa. Você pode ouvir alguém como Jeff Beck tocando uma nota
e saberá quem é. Conforme cresço como musico, fico mais confortável em soar
como mim mesmo. Eu penso que muitos guitarristas fazem cover de si mesmos e eu me interessei mais que minha musica estives em um estado nu.
SR:
Fisicamente falando, como você aborda o aspecto rítmico do seu estilo? É uma
batida forte, é imprudente?
Definitivamente eu faço os dois; eu definitivamente
toco tão forte quanto possível, muitas vezes. Nos últimos anos eu me aproximei
de coisas que podem ser tocadas gentilmente, algumas harmonias e coisas que
apenas surgem se você toca suavemente. E então quando você toca forte também
significa algo.
SR: De
certa forma você traz uma abordagem de ritmo acústico para sua execução
elétrica. Você concorda com isso?
Eu acho que sim; Toco muito nas duas coisas, mas o
que você está falando é como dedilho muito. É difícil dizer se um influencia o
outro porque eu não penso muito nisso. No que diz respeito à força do meu pulso
direito, isso vem do punk, de tocar todas as batidas de baixo. Punk é o que eu
comecei a tocar e é daí que vem todo esse poder. E parte disso vem de ter
tocado tanto funk com Flea. Passamos milhares de horas tocando funk juntos e
provavelmente é daí que vem muita sutileza e delicadeza no meu pulso direito. É
provavelmente o meu principal lugar em que me expresso é tocando guitarra
rítmica, mas, ao mesmo tempo, não é algo que eu tenha consciência.
SR: Você
se descreveria como um solista no sentido tradicional? Mesmo sua abordagem nos
solos tem um elemento rítmico e normalmente não vem apenas de uma escala de
blues.
Eu estou mais interessando em fazer coisas
texturizadas com a guitarra e tentar encontrar maneiras de tocar interessantes.
E para mim, a abordagem de solos de guitarras de estrelas do rock é um beco sem
saída. Não vejo muitas pessoas levando isso a lugar algum. E para mim, os
guitarristas mais interessantes que tivemos nos últimos vinte anos não foram
solistas.
Teve gente como Bernard Summer do Joy Division e
New Order, Johnny Marr do The Smiths, Jonny Greenwood no Radiohead e Kurt Cobain
no Nirvana... Nenhum deles era solista. Todas essas pessoas fizeram coisas
interessantes com o seu som e fazem guitarras interessantes, mas não são
chamativas. Para mim esse estilo de guitarra atingiu o auge com Jimmy Page e
não acho que ninguém nunca vai superá-lo. Eddie Van Halen, eu pensei que
tivesse ido a algum lugar interessante mas novamente eu não acho que foi muito
além disso. Eu adoraria se alguém chegasse e tocasse uma guitarra chamativa que
me interessasse. Eu penso que as pessoas que levaram isso a uma direção mais
interessante são as pessoas que trabalho com sons e caminhos nos quais a
guitarra elétrica é transformada em diferentes instrumentos. Se você se limita
a guitarra do ponto de vista do blues, é apenas um instrumento. Mas se você
olhar para o que Keith Levine fez no Public Image em seus dois primeiros
álbuns, é um instrumento diferente para cada musica.
A guitarra é muito versátil. Para mim é o melhor
instrumento já inventado. Pode ser tantas coisas e é infinita – o instrumento
que Robert Fripp tocou não é o instrumento que Jimi Hendrix tocou, não é o que
John McGeoch no Magazine tocou.
As vezes ao vivo, no Chili Peppers eu entro nessa
coisa de guitarra chamativa de rockstar, mas é mais por causa da energia de
tocar diante do público. Não é algo que me interessa musicalmente, é mais algo
que faço mais porque aproveito a interação entre o público e o impacto que é
gerada na troca de amor.
E muitas vezes é algo que vai me fazer tocar em um
estilo mais blues e chamativa e outras coisas. Se você já me viu tocar ao vivo
talvez tenha um vislumbre de mim como guitarrista mas normalmente se estou pensando
mais em musica e no que estou interessado quando estou gravando, para mim tocar
guitarra deve ser uma declaração sonora textual na musica ou deve ser algo tão
melódico e bonito que você cantaria.
SR: O
que nos leva à musica seguinte, Second Walk – aquela pequena passagem em
overdrive, de onde veio? Você senta e faz as mudanças e chega a um riff ou é
algo sem preparação? É a mesma abordagem com os Chilis?
Normalmente é com na primeira tomada. Eu acho que o
que acontece muitas vezes no Chili Peppers é que na primeira vez que decidimos
fazer um solo em uma musica eu sou contra ter qualquer sessão de solo. Eu não
estava nessa. Passo por períodos quando estou gravando que não gosto e quando
estamos em turnê quero que todos os solos sejam longos. Em turnê vou lá e solo
por dez minutos.
SR: Você
mencionou um fator chave em seus solos que é o aspecto melódico – de onde veem
aquelas notas escolhidas?
Normalmente eu tento criar uma justaposição entre o
que Flea está tocando e o que estou tocando. Eu tento trabalhar com o espaço
entre o que estamos fazendo. Eu penso
mais em moldar o espaço que há entre a guitarra e o baixo do que “o que eu
posso fazer sobre isso?” Se Flea estiver colocando o mastro aqui [gesticula
para o lado com a mão esquerda], eu vou colocar um mastro aqui [gesticula com a
mão direita] e, assim, criando essa cor entre nós. As coisas teóricas em que
penso, têm mais a ver com criar espaço.
SR:
Uma musica como Dosed no ultimo álbum dos Chili Peppers representa esse aspecto
de luz e sombra que você está falando?
Essa surgiu quando o resto da banda estava fora
durante um intervalo de ensaios, eu estava lá e tinha um pedal Line 6 green
loop. Fiz o loop de uma parte da guitarra e depois acrescentei outra parte e
outra parte. Eu tinha aquelas três partes de guitarra tocando e tocava sobre
elas. E depois quando todos voltaram eu tinha esse belo loop. Na gravação eu
toquei cada parte separadamente para que pudéssemos colocar em estéreo.
SR: E
sobre a faixa Can’t Stop? O groove é extremamente suave
Sim, meu timing é muito bom. Eu sei que é
exatamente isso que eu estava tocando com Chad quando estávamos gravando e
geralmente é o que é. Eu geralmente não conserto as coisas. Não há muita edição
ou alteração nas minhas faixas [ritmos].
SR:
Em seu novo álbum solo, você está pensando nos mesmos termos? Ritmicamente e
nos solos?
Eu não penso muito sobre o espaço entre eu e a
outra pessoa, penso apenas em embelezar uma música minha. Uma coisa como o solo
no final de Omission foi apenas a ideia de ter um grande final e depois ter um
solo pequeno, num tom tipo Tom Verlaine. É provavelmente a [Fender] Jaguar.
SR: Shadows
Collide With People é temperado com todos os tipos sons de teclado. Usar um
teclado traz diferentes elementos para sua música? Em oposição aos Chilis que
são simplesmente um trio?
É apenas uma parte de toda minha ideia para esse
álbum; eu queria que tivesse muitos sons de teclado e queria centrar em sons atípicos
em sequencia. Para nós quando fizemos as demos, essa foi a parte divertida.
Achar um som de sintetizador realmente interessante para colorir as musicas. E
virtualmente toda a musica tem em seu coração uma guitarra acústica.
Eu escrevo as musicas na guitarra acústica e esse
também foi o conceito para esse álbum. Na musica Omission, quando fica rápida
no final, eu poderia ter facilmente acrescentado uma guitarra elétrica, teria
feito sentido. Mas a ideia era ter a guitarra elétrica faltando e o violão tocando
forte e rápido. Parte da ideia dessa musica para esse álbum foi não exagerar em
algo com a guitarra elétrica que poderia ser simplesmente expressas com o
violão.
SR:
Voltando com os Chilis por um momento, com você descreve o ritmo em “Cabron”?
Essa foi inspirada na guitarra de Martin Barre em
Aqualung do Jethro Tull. Foi dai que veio aquela musica porque eu tinha
aprendido todas as musicas de Aqualung porque ele estava usando o capo todo o
tempo no álbum. Eu comecei a escrever algo como aquilo. O fato de acabar soando
como algo mexicano tem mais a ver com os vocais de Anthony e a bateria de Chad
do que com a parte da guitarra. Se você analisar a parte da guitarra, se
aproxima mais de rock progressivo. É uma
guitarra rápida e cheia e foi engraçado Anthony querer construir uma musica em
torno disso, porque eu só tinha escrito como uma parte de guitarra.
SR: De
certa forma, você equilibra os vocais melódicos e rítmicos de Anthony com suas
partes de guitarra? Em um tipo de rotina de chamada e resposta?
Não, os vocais dele respondem à minha guitarra. A
guitarra sempre vem antes dos vocais no Chili Peppers de modo que quando você
escuta a guitarra e o vocal fazendo a mesma coisa é normalmente por que ele
está cantando junto com a guitarra. Por exemplo em “Don’t Forget Me” minha
ideia para o verso era ir e voltar entre um som tipo de maquina e um som
fluente. Essa musica é um exemplo de Flea tocando a mesma linha de baixo
repetidamente por quase meia hora
enquanto eu toco diferentes partes da guitarra por cima. E aquelas são
provavelmente as primeiras partes de guitarra que toquei. Então ele pisou em
seu fuzz e eu no wah wah para o refrão. Você deve tentar ouvir a versão ao vivo
dessa musica porque na gravação Rick Rubin fez as harmonias mais altas e
abaixou a guitarra no refrão. A ideia para o refrão dessa musica era algo
overdrive, pesado, além da conta. Nos colocamos uma versão ao vivo como lado B
em um single desse álbum e é ali que você pode ouvir a intenção original.
SR: Você
pode descrever o que estava fazendo no verso naquela figura em repetição?
Aquele som que você está falando é um eco nas
tercinas por toda a musica. Se eu estiver escolhendo semicolcheias -
dooga-dooga-dooga-dooga - com o eco das tercinas, soa como
doodladoodladoodladoodla...E na verdade a pessoa que eu estava pensando quando
cheguei a isso era Daniel Ash; tem uma musica do Bauhaus chamada “Double Dare”
eu estava pensando nisso [do álbum in The Flat Field].
SR:
Existem vários instrumentais no seu álbum. A guitarra precisa mudar a abordagem
quando não há voz para competir?
As musicas instrumentais aqui não tem guitarra. “23
Go Into End” tem uma guitarra mas não sou eu ou Josh [Klinghoffer]. É Omar
Rodrigues e ele está tocando guitarra slide. Basicamente passamos o dia todo
nos sentimos debaixo da agua compondo essa musica ambiente. Nos inspiramos nos
álbuns ambiente de Brian Eno e nos discos de Edgar Froese, Epsilon In Malaysian
Pale. “Negative 00 Ghost 27”é um som no qual configurei o sintetizador modular
para processar um som de coral de um Mellotron; configurei o som e depois Josh
entrou e transformou o Mellotron nesse feedback, uma espécie de som áspero. Eu
trouxe Josh e, cinco minutos depois, tínhamos o que você ouve no disco.
SR: E
no outro extremo do espectro há uma faixa como "Water", que parece
incorporar a abordagem dos anos sessenta, talvez remanescente do período The
Kinks ou The Who's Happy Jack?
Josh e eu amamos Kinks e acho que eu estava ouvindo
muito o álbum Arthur enquanto estávamos fazendo esse disco. Mas quando eu
escrevi essa musica eu estava tentando fazer algo como Talking Heads. E para o outro
eu estava tocando para Chad [Smith] uma batida de Aphex Twin na qual a bateria
sempre esta fora do tempo e eu tentei faze-lo tocar algo como aquilo, você
est[a tocando uma batida bem rápida e fora do tempo.
SR: Como
produtor, você consegue sentir quando uma pequena passagem solo está certa?
Quando você escolheu as notas certas e o tom complementar perfeito?
Eu nunca tenho duvidas sobre o que é bom ou o que
não é bom. Eu sempre tenho muita certeza de mim.
SR:
Voltando aos Chilis por um momento, Rick Rubin escuta suas partes de guitarra
com os mesmos ouvidos que você? Ele entende o que você está tentando criar?
Bem, eu produzo minha guitarra com os Chilis, Rick
não tem nada a ver com ela. Rick cuida mais da bateria e do vocal, e da
mixagem; quando se trata da guitarra ele me deixa sozinho e Flea também ele
deixa sozinho. Ele pode sugerir coisas ocasionalmente para mim ou Flea; em Warm
Tape ele disse que eu poderia fazer algo como George Harrison fez com a
guitarra de 12 cordas em algumas musicas dos Beatles.
E funcionou perfeitamente com o que eu estava
pensando porque eu já tinha feito um overdub então acabou sendo uma guitarra
respondida por uma guitarra de 12 cordas. Então ele joga pequenas ideias no
meu caminho mas ele não fala “aquela parte de guitarra não está funcionando”
SR:
Tem alguma musica no seu álbum que teria funcionado com os Chili Peppers?
Eu acho que a música “Cut-Out” tem um acorde ou
dois em comum com “I Could Die For You”.
Eu tinha usado o acorde em uma das minhas musicas e depois eu pensei, eu
deveria usar esse acorde numa musica do Chili Peppers”. As vezes as ideias se
cruzam mas em geral, é muito claro para mim quando eu devo escrever a letra de
uma musica minha. E quando se trata do Chili Peppers, quando chego a uma parte
de guitarra e não sei o que mais onde leva-la, eu não penso no vocal. Penso em
algo que é interessante por si só como parte da guitarra. Enquanto nas minhas
músicas talvez eu não ache as partes da guitarra tão interessantes, é mais em
relação aos vocais e ao que estou imaginando que os sintetizadores estejam
fazendo.
SR:
Qual foi a semente inicial para as musicas no seu álbum?
Minhas musicas são escritas no momento que são
escritas. Se eu tenho uma ideia para uma musica eu sento até
terminar...independente se demorar cinco minutos ou três horas. Eu sempre
termino ou eu nunca termino. Eu posso entender por que você ficaria confuso se
pensasse que minhas músicas foram reunidas em pedaços; é assim que eu faço
coisas de Chili Peppers, juntando as coisas em pedaços. Para minhas músicas, eu
as concebo naquele momento
SR: Se
estivéssemos escrevendo a cartilha sobre como alcançar o tom de guitarra de
John Frusciante, como você descreveria isso?
Tocar a guitarra bem forte. Usando as palhetas
laranja da Tortex [Jim Dunlop]. E eu uso cordas .010 e se estou tocando a
[Gretsch] White Falcon eu uso .012.
SR: Por
que o Stratocaster é o instrumento com que você se sente mais confortável?
Bem, eu simplesmente não tinha uma Les Paul;
comprei uma recentemente. Agora as principais guitarras que uso são uma
Telecaster e a Les Paul; com essas duas você consegue todo tipo de som. A Les
Paul é uma 69 mas eu queria que fosse 59. Eu amo a Les Paul que tenho. Mas na
minha opinião a maneira como toco tem muito a ver com a Telecaster. E
recentemente eu comecei a usar amplificadores Vox e parei de usar Marshalls.
Mas ainda soa como de costume. Ah e outra coisa, se estou tocando um acorde de
duas notas ou três notas, toco todas as cortas. Eu bloqueio as cordas que não
estou usando com a mão esquerda. Com meu polegar ou meus outros dedos. E acho
que isso tem muito a ver, porque a maioria das pessoas toca um acorde de duas
notas no meio da guitarra e só está escolhendo essas duas notas porque tem medo
de tocar as outras cordas.
Digamos que alguém esteja aprendendo a tocar "Can’t
Stop" e vai tocar apenas as notas individualmente. Eu estou tocando todas as
cordas para cada nota mesmo que eu não esteja tocando duas notas ao mesmo
tempo. É uma linha de uma nota só mas eu toco todas as cordas e bloqueio todas
as outras com minha mão esquerda. Se eu tocasse uma nota apenas não soaria nada
como eu. É muito mais algo de percussão. É muito natural para mim e eu só tomo
consciência disso quando mostro alguma musica para alguém.
SR:
“The Slaughter” é uma faixa interessante, com Flea e Chad tocando juntos
Sim, ele toca baixo vertical nela. Quando escrevi a
musica eu estava tentando usar alguns acordes. Vai de Ab para A e depois esse
acorde diminuto, depois para um B e C#m e esse acorde diminuto. E depois um
F#m6, E e F#m6. Mas a grande mudança é Am6 para A7. Eu sempre estou buscando coisas interessantes
para fazer; mudar de Am6 para A7 é algo inusitado que não acontece em muitas
musicas.
Quando você consegue dar sentido para algo do tipo,
quando um acorde estranho faz sentido no contexto da música, é isso que estou
sempre buscando. Eu tenho orgulho dessa música porque estou usando certos
acordes. Eu sei que não sou o único compositor que usa isso como sua principal
razão para escrever musicas. O que é divertido sobre escrever musicas é que e
como um pequeno jogo matemático de tentar fazer algo interessante.
Normalmente eu vejo alguém usando um acorde. Vejo
Paul McCartney usando um acorde ou John Lennon e eu tento imaginar um jeito de
fazer aquele acorde. Mas, às vezes, isso ocorre apenas praticando e aprendendo
coisas como as músicas de Charles Mingus, e isso provavelmente veio de alguma
coisa de jazz em que eu estava trabalhando. Eu sou fascinado como as pessoas
usam acordes de maneiras diferentes e Charles Mingus era definitivamente uma
das pessoas que eu estava estudando na época.
SR: E
sobre seu vibrato com o dedo? Você nunca falou muito sobre isso. Não se escuta
muito de vibrato em suas musicas
É uma decisão consciente; não que eu não possa
fazer. Porque sinto que as pessoas exageram. Mais uma vez, sinto que Jimi
Hendrix fez isso em todo o seu grau; ninguém fará mais do que isso, ninguém
fará melhor do que isso.
Eu me lembro que no solo de “Minor Thing” eu faço
um vibrato bem suave. É apenas aquele tipo de som distorcido. É uma cor eu
posso usar mas apenas como uma cor, não quero que seja algo que eu dependa. O
que consegui ao não fazer vibrato é que encontrei maneiras mais coloridas de
organizar notas e equilibrar artisticamente as coisas que estou tocando. As
notas tem que falar por si e o ritmo tem que falar por si. Embora você possa
criar algumas notas desinteressantes com vibrato e fazê-las parecer
interessantes, isso não me parece um desafio. Prefiro encontrar algumas notas
que, por si mesmas, sem vibrato, são interessantes. E, como eu disse, se eu me
deparar com uma situação em que precisa de vibrato, eu posso fazê-lo. Mas
prefiro parecer que não tenho a capacidade de fazê-lo porque acho emocionante
quando ouço pessoas que não têm essa capacidade.
SR:
Mesmo o uso da barra de tremolo na Stratocaster é limitado
Atualmente é assim mas se me conhecesse quando eu
tinha 17 anos você não diria isso. Sim, eu uso principalmente a barra ao vivo
para obter feedback. É aí que eu gosto de usá-lo. Acho que é apenas uma
daquelas coisas em que tem sido usada de várias maneiras diferentes e acho que
quero fazer algo novo. Portanto, geralmente é um uso sutil.
SR:
Por fim, Shadowns Collide With People é o reflexo perfeito de você como
guitarrista?
Sim, é exatamente o que me propus a criar. Os
registros anteriores são todos demos; nenhum deles foi realmente concebido como
"Vou gravar". Era mais como se eu tivesse um certo grupo de música, em
colaboração com Josh e estávamos sempre cantando harmonias juntos e sabíamos
que queríamos fazer um disco com muitas harmonias e muitas partes do teclado e
muitas músicas com acordes interessantes.
Mas
sem muita guitarra!
Não há muita guitarra tocando e baixo chamativo. A ideia
para o disco estava clara em nossas cabeças. Josh é um ótimo guitarrista e sou
conhecido por ser um guitarrista, e sabíamos desde o dia anterior de entrar em
estúdio. Nós pensamos: “Devemos adicionar solos de guitarra neste álbum?”
[Muitas risadas]. E ele disse: "Não é um disco muito orientado para a
guitarra". Não era isso que estávamos fazendo nesse disco. Tenho certeza
de que um dia faremos um disco com muita guitarra.
Tradução: Eloá Otrenti - Frusciante Brazil
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