30 de janeiro de 2018

Um soldado do ar - Janeiro de 1995

Perfil
John Frusciante por James Rotondi


Quando John Frusciante deixou o Red Hot Chili Peppers logo depois do gigantesco sucesso de 1991 "Blood Sugar Sex Magik", ele desapontou um monte de fanáticos por guitarra. Enquanto sua pegada no álbum anterior "Mother's Milk" era frenética, inspirada em funk-metal, foi em BSSM que Frusciante tropeçou em uma eletrizante alquimia. Misturando acid-rock, soul-funk, início do art-rock e estilos de blues com crueza e tons não processados de Strat-e-Marshall, ele bateu em uma fórmula explosiva que ainda está para ser duplicada.

A excêntrica reputação de Frusciante já estava crescendo quando a banda fez sua estranha e afetada apresentação no Saturday Night Live, antes da renúncia. (Frusciante continua tocando com o baixista Flea e o baterista do Porno For Pyros Stephen Perkins em um trio de improvisação chamado "The Three Amoebas). Seu novo e dopado álbum, simplesmente chamado de John Frusciante, não fará muito para diminuir essa reputação. Uma coleção de gravações 4-track extremamente estranha e músicas com títulos como "Your Pussy Is Glued To A Building", é repleto de espírito surrealista, arranjos desajeitados estilo "The Madcap Laughs" do Syd Barret, "A Beard Of Stars" do Marc Bolan, e o clássico cult do "Oar" do alienado guitarrista do Moby Grape Alexander "sKip" Spence. Com apenas sua voz (e em poucos momentos a do seu parceiro River Phoenix), Fender Jaguars e Strats, um velho acústico sem nome, alguns pedais fuzz e manipulação de fita, Frusciante criou algo realmente bizarro. Ele explica sua saída do Peppers, escutar o subconsciente e o método de sua loucura.

Um Soldado Do Ar
Frusciante: Eu gravei o álbum em parte só para me divertir, fumar maconha e viajar minha cabeça. Mas eu estava fazendo algo pela mesma razão que eu sempre gravei e escutei música, para criar sensações e sons que eu gostaria de escutar num CD. Não havia intenção de que ninguém ouvisse, mas um monte de amigos meus que respeito artísticamente imploraram para que eu lançasse - pessoas como Gibby Haynes do Butthole Surfers, Johnny Depp, Perry Farrel, Flea e River Phoenix. Eles achavam que não havia mais música boa, e que eu era obrigado a mostrar isso. Eles realmente imploraram para mim de um jeito emocional, então eu decidir fazer.
Mas eu nunca fiz nada com outro própósito além de ser um soldado do ar. Quando eu estava fazendo o Blood Sugar, nunca me passou pela cabeça que aquilo ia ser vendido pelo mundo inteiro. Eu disse para o Flea: "pessoas estão indo comprar e escutar a nossa música em suas casas?" e ele disse "Sim". E eu disse: "por todo país?" e ele: "pelo mundo todo". Isso me trouxe a um ponto de liberdade que é alheio a tudo isso. Eu só fechei meus olhos e fiquei girando em torno, com 10 pensamentos de uma vez só, indo a lugares sem nenhum pensamento consciente.

Usually Just An Eighth-Note
“Usually Just A T-Shirt", como é chamado o segundo lado, era uma improvisação em violão; eu só fiz solos de trás-para-frente sobre a coisa toda. Esse pode ser o primeiro solo de trás-para-frente realmente longo, e está certo em ser longo porque vai para algum lugar, e é uma história. Emocionalmente, tem muitas dinâmicas. Normalmente solos em reverso não podem ajudar, eles não vão a lugar nenhum - as pessoas ficam apenas improvisando. Mesmo os realmente bons não vão de um lugar para outro, e esse vai. Eu podia ouvir como ele soaria para frente quando estava gravando ao contrário.

Eu contratei um cara, paguei uns $20 000, e juntos transcrevemos “Usually Just A T-Shirt” para quarteto de cordas. Foi difícil pra ele; eu tive que corrigir toda página que ele fez. Eu não tinha nada transcrito até então, mas tudo voltou para mim de imediato, surpreendentemente. O cara escreveria 3 páginas de 4/4, 5/8, 7/16, 5/4. Ele escreveria tudo nesses tempos, e eu estava "Não, é tudo 4/4, cara", e ele dizia "Não, não tem como ser tudo 4/4". Ele não acreditava que se você contar "1" e esperar uns 30 segundos "2" e esperar mais 30 seg "3"... você sabe, tipo, se você contar tudo realmente devagar o ritmo acaba em 4, o que significa que você pode escrever tudo em 4/4 através dos compassos, o que são só acentos. Ele tropeçou nisso. Tinham várias coisas que ele não achavam que eram possíveis e que cosmicamente acabaram nesse caminho. É bem viajante isso no papel.

Você vai escutar isso sendo executado?

Não até que eu ache um quarteto de cordas que entenda que Ringo Starr era um ótimo baterista, saiba tocar Stravinsky e também fume maconha. Eu estava vendo o Kronos Quartet para tocar, mas eles tocam "Purple Haze" como uma porra de banda de marcha tocando rápido. Fumar maconha e relaxar faz parte disso. Fumar erva cria um fluxo criativo. Te mantém em contato com partes do seu subconsciente que não tem como você chegar de outra maneira. Eu, pessoalmente, agradeço à maconha pela melhor transformação que qualquer coisa já me deu pelo modo que eu toco. Quando eu virei um maconheiro eu improvisei mais do que todo tempo que estive tocando.

Você gostaria de ser um Pepper também?

Eu passei um longo tempo com os Peppers não gostando de nada além de tocar com Flea. Focar seus olhos e focar meu amplificador, essas eram as únicas coisas boas. Enfim eu sai. Logo depois de gravar o álbum foi a primeira vez que quis sair, e foi porque vi a direção que estávamos indo em nossa carreira, eu sabia que eu não iria gostar. No último show dos Peppers com Hillel Slovak que vi, minha namorada perguntou pra mim: "Você gostaria de estar nos Chili Peppers mesmo se eles fossem populares e tocassem no (20000 lugares, Inglewood) Forum?" e eu disse: "Não, mas eles nunca vão tocar no Forum, porque isso iria contra toda a razão que venho a todo o show e pulo por todo lugar e sinto como se eu fosse da banda. Eu não posso imaginar isso acontecendo." Nesse tempo, estar em um desses shows deles foi uma das vibrações mais densas que eu já experimentei na Terra. Era incrível. Era tão mágico, você realmente se sentia parte da banda, mesmo que você estivesse na audiência.

Hoje em dia a audiência canta junto com as músicas lentas, porque é a única merda que eles podem fazer parte. Eles estão tão entalados em assentos, vendo esses caras pulando por tudo como maníacos. Eu vi que iríamos começar algo que a banda nem era capaz. Essa foi a única razão, mas a vibração tinha marcas em várias outras áreas da organização, que é algo que eu realmente não gosto. Eu não tenho nenhum problema em ser um rockstar, por causa de pessoas como Bowie ou Hendrix. Mas eu tenho problema com a merda de classificação de rockstar, como pessoas tratando Bowie como se ele fosse Nikki Sixx, ou pessoas tentando transformar Bowie num Sixx ou esperando ele agir como Sixx. Esse é o aspecto de estrela do rock que eu acho que é ruim. Quando eu estava na banda eu estava tipo "Eu não sou um rockstar! Eu não sou nada! Eu odeio toda a audiência! Eles são um bando de idiotas, eu tô pouco me fodendo para eles!"

Desde então eu fui capaz de ver o que estava acontecendo realmente. Mesmo que a audiência possa ter um mau gosto às vezes, eles estão realmente numa posição horrível nos Estados Unidos, porque a música é a única afeição que eles tem que é real. Se você faz música boa, mostre para eles o máximo possível, porque eles realmente precisam, sabendo ou não. Os pais ou seus amigos na escola não lhes dão nenhuma afeição, então eu me sinto produtivo dando isso a eles.

Tradução: Jonas Mayn

Scans:




Fonte: Guitar Player - Janeiro de 1995

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