1 de fevereiro de 2018

UF ENTREVISTA: TONI OSWALD (2012)


Entrevista com Toni Oswald concedida para o Universo Frusciante - com colaboração dos admiradores do site para elaborar as perguntas - e publicada em 09 de novembro de 2012. John Frusciante e Toni viveram um tempo mágico juntos na adolescência. Hoje os dois compartilham uma paixão pelas artes.

A primeira pergunta é sobre seu mais recente trabalho musical chamado In The Little Lands. O que você poderia nos falar sobre ele? 

Bom, foi gravado durante um período de alguns anos em que estive escrevendo meu livro, The Diary of Ic Explura. Foi realmente feito para ser uma coisa divertida para se fazer. Eu não tinha nenhuma real ambição com as músicas, apenas queria explorar sons e suas possibilidades de expressão de sentimentos. Eu estava passando por momentos emocionais pesados na época e isso se tornou outro jeito para mim de processar esses sentimentos e expressar algo sem ser tão cuidadosa. Acho que estava procurando por liberdade.

Você também lançou os álbuns The Diary of Ic Explura Part 1 & Part 2, como foi trabalhar com Josh Klinghoffer e Max Davies? 

Adorei trabalhar com Josh e Max. Josh e eu trabalhamos muito rápido, gravando o Part I em alguns dias se não me engano, e ele também me deu espaço e liberdade para executar minhas idéias. Já Max e eu trabalhamos por mais tempo no Part II e foi mais do que uma colaboração. Ele me ajudou e me inspirou muito a realmente me desafiar e crescer como música e artista. Devo a ele muitos agradecimentos.

Como foi o processo de gravação de The Diary of Ic Explura Part 1 na casa de John? Que equipamentos dele vocês usaram? 

Foi divertido! Ele não tinha muitos móveis naquela época, então tivemos muito espaço em diferente cômodos para nos espalharmos e aproveitamos isso gravando no chuveiro, na varanda, etc. Jesus, sobre equipamentos, apesar de fazer um pouquinho de tempo, consigo lembrar que usamos meu antigo violão Gibson dos anos 20, um sintetizador Moog e um piano elétrico Roland do John, algum material de synths da Roland e não consigo me lembrar qual a guitarra que Josh tocou. Então Josh gravou bateria e percussão em sua casa. Desculpe, faz tanto tempo que sei que estou esquecendo alguma coisa...

Como surgiu o apelido "Ic Explura"? 

John me deu o nome de Ic Explura. Perguntei a ele um dia: "Se você tivesse que me dar um apelido, qual seria?". Ele apareceu alguns dias depois com Ic Explura. Ic é pronunciado como Ik em alemão. Depois soube que Ic pode significar um fluxo estelar, mas não tenho idéia do que John quis dizer com esse nome, é muito misterioso e gosto que seja assim.

Quando e como você conheceu John? 

A primeira vez que o encontrei foi quando Anthony o levou para a minha festa de aniversário de 21 anos.

Você já disse que foi John quem te deu sua primeira guitarra, uma Gibson ES-335, além de te incentivar a tocar. Como você descreveria a importância de John para que você se descobrisse como música?

Eu devo tudo a John a respeito disso. Ele me inspirou completamente a querer tocar música. Antes de conhecê-lo, eu era atriz e escritora, e fazia alguns desenhos e pinturas, mas depois que começamos a sair, fiquei realmente interessada em querer aprender música.

Além da música, qual era a relação de vocês com a pintura? Foi realmente você que o incentivou a pintar? 

John já pintava quando nos conhecemos e eu amava de verdade suas pinturas e desenhos. Começamos a desenhar e pintar juntos e cada um incentivou o outro a continuar. Costumávamos viajar com quatro malas nas turnês: uma para roupas, uma para papel e pincéis, uma para cd's e cassetes e uma cheia de livros, e tínhamos nossos instrumentos musicais. Foi bastante divertido passar por hotéis e armar nosso pequeno mundo artístico. Acho que era nosso jeito de proteger um ao outro do mundo louco que estava lá fora.

Quando ele te deu o quadro que é a capa de Smile From The Streets You Hold? 

Depois da primeira vez que saímos, ele voltou para a turnê sozinho e pintou esse quadro para mim em seu hotel numa noite. Quando nos vimos de novo, ele me deu.

John te presenteou com mais alguma de suas pinturas? 

Sim, ele me deu mais algumas.

Depois de 18 anos que Niandra Lades And Usually Just A T-Shirt foi lançado, como você poderia descrever sua experiência e colaboração no álbum? 

Bem, é um álbum do John, não uma colaboração...Apenas cantei em três músicas. Ajudei a ele a juntá-las e em outras coisas de pós-produção, mas é a sua maravilhosa obra-prima. Minha experiência de ouví-lo escrevendo e gravando foi uma coisa muito especial...Não é uma coisa que você consegue expressar com palavras. Quanto aos meus vocais, foram feitos muito espontaneamente e rápidos. A música era pura liberdade! Tenho muito orgulho de ter feito parte disso.

Niandra Lades quando foi lançado não tinha nem uma auto-idealização. John disse recentemente em uma entrevista: "A música era a pura música da vida". O que você sentiu ao ouvir o álbum pela primeira vez? 

Me senti em casa.

Você saberia dizer quantas músicas John gravou para o Niandra Lades? 

Não.

Sabemos que você gravou, dirigiu e atuou em um filme conceitual chamado Desert In Shape, cujo algumas das cenas serviram de capa e contra-capa para Niandra Lades... Você poderia falar um pouco mais sobre o conceito do filme e se você pretende realmente lançá-lo algum dia? 

O filme Desert In Shape é um curta-metragem experimental, que foi inspirado por Marcel Duchamp e por alguns sonhos que eu estava tendo enquanto viajava pela Europa com John. Foi filmado pelo meu amigo, o pintor Greg Gibbs, e tem como atores eu, John, Clara Balzary e Matt Polish. John fez a música depois do filme ser finalizado. Ele usou um frame do filme para capa e contra-capa do Niandra. É um filme muito querido por mim. É sobre uma garota obcecada por Duchamp enquanto ao mesmo tempo tem sonhos sobre sua infância que cria nela um medo de sair de casa. No fim, ela é inspirada pelos trabalhos de Duchamp para superar seus próprios medos, sua agorafobia e seu passado. Não sei se algum dia será lançado. Agora o Los Angeles Don't knock the Rock and Film Festival está interessado em mostrá-lo em algum momento do ano que vem. Seria legal.

Como surgiu o nome "Niandra Lades"? Ela é uma personagem do filme? E o que significa "Usually just a T-shirt"? Foi a partir de Desert In Shape que o álbum ganhou um nome? 

John que inventou o nome. Não sei de onde ele tirou. John como Niandra/Rrose Selavy é uma personagem do filme. "Usually Just a T-shirt" apareceu porque quando John foi para turnê no começo do nosso namoro, decidimos apenas vestir as roupas um do outro enquanto estivéssemos distantes. Mandei para ele em turnê uma grande caixa com minhas calças e camisetas e ele me ligou perguntando o que eu costumava usar com aquelas minhas calças listradas dos anos 60 que eu tinha mandado, e então respondi "Geralmente apenas uma camiseta". Depois essa frase se tornou o nome da fita cassete que costumávamos ouvir no carro e que continha as músicas que hoje vocês conhecem como o Usually Just a T-shirt.

Você atuou, escreveu ou dirigiu algum outro filme? 

Fiz alguns outros curtas com uma Super 8mm, como também filmes para as coisas sobre Ic Explura que eu precisava editar. Também escrevi um filme com meus amigos Mariah O'Brien e Dick Rude que nunca foi feito. Além disso, apenas atuei em alguns filmes.

Em 1997, John lançou Smile From The Streets You Hold, que contem muitas outtakes do Niandra. Mesmo sendo um período pessoal difícil, ele já disse que lançá-los foi algo muito natural, e que eram muito significativos para ele e seus amigos quando os fez. Qual é seu sentimento sobre aquele período e como você reflete isso na sua personalidade hoje? 

Não sei como isso afeta minha personalidade hoje em dia, mas a música significa muito para mim e tenho muitas lembranças incríveis daquela época.
Como você se sente com algumas pessoas dizendo que você foi a causa do declínio da carreira do John? 
Não conheço pessoas que dizem isso. Quem disse que ele teve um declínio na carreira de alguma forma? Só porquê ele escolheu deixar a banda que o estava fazendo infeliz naquela época? Ele ainda estava pintando sem parar, fazendo música, como também lançando o Niandra e escrevendo bastante. Acho que essa afirmação é desprezível e falsa. John toma todas as suas decisões, tem uma determinação muito grande e sempre vive a vida que quer viver. Seria idiota para qualquer pessoa pensar o contrário. As pessoas deveriam respeitar isso.

Depois desse período, John vem numa sólida carreira solo. Que diferenças você enxerga desse momento atual com os primeiros álbuns lançado por ele? 

Adoro todo o trabalho do John. Acho que mais do que tudo ele é uma pessoa que adora música e sempre está fazendo isso e tentando se expandir e crescer como artista.

Tem algum álbum do John que seja o seu favorito? 

Acho que sou mais inclinada para o Niandra Lades and Usually Just a T-shirt, mas também adoro o To Record Only Water For Ten Days, assim como o Empyrean.

Você já ouviu os lançamentos recentes do John, Letur-Lefr e PBX Funicular Intaglio Zone? Se sim, o que acho desse novo estilo "Progressive Synth Pop" dele? 

Para ser honesta, ainda não ouvi. John normalmente me manda seus trabalhos, mas nós dois temos estado muito ocupados ultimamente com nossos projetos. Mas estou a caminho de ouvir.

O John já fez um música para você, "A Song For Toni". Como se sente quanto a ela? 

Sempre me faz sorrir e me sinto muito tocada. É um pequeno momento de nossas vidas.

O que John Frusciante significa para você? 

Um amigo querido e uma inspiração.

Vocês mantem contato constante? 

Não.

Qual é a relação musical de vocês hoje? Seria possível vocês trabalharem juntos em algo novo de alguma maneira?

Não, nada planejado. Estamos cada um fazendo suas coisas.

O que você acha da cena musical atual? Sente falta de alguma coisa do passado? 

Recentemente li uma frase de Patti Smith em que ela diz que hoje em dia as pessoas estão mais preocupadas com a carreira do que realmente ser um artista e eu concordo veementemente com isso. As pessoas parecem estar mais focadas em fazer dinheiro e serem famosas do que ser um artista de verdade, fazer arte por amor e nada mais. Sinto falta disso do passado. Cresci ouvindo punk rock e um monte de música alternativa e experimental que estavam do lado de fora da sociedade. "Do lado de fora da sociedade, é onde eu quero estar...", parafraseando Patti Smith novamente.

Você conhece algo sobre a música brasileira? Será que vamos ver ao vivo um dia Ic Explura?

Escuto um pouco de música brasileira...Os Mutantes, Gilberto Gil e algumas outras coisas. Queria conhecer mais! Acho que não vou estar tocando no Brasil em breve, mas você nunca sabe o que o futuro te guarda.

Como nós, você também possui um blog, The Buttermilk Bread and Girls Confess the Zodiac, onde você posta poemas, pinturas, diários, análises e fotografias de você e seus amigos. Você é uma pessoa muito reflexiva sobre o que acontece com você e o mundo a sua volta? 

Acho que todos nós somos. Todos vivemos nesse mundo, pegamos o que está a nossa volta e refletimos esperançosos que isso nos ajude a crescer. Todos somos seres criativos. Faço arte, escrituras, poemas e música para dar sentido à minha experiência. Esse também é um jeito divertido de passar o tempo e me dá muito prazer, curtindo compartilhar isso com os outros e se eles também estiverem inspirados a criar coisas, aí se torna tremendamente legal.

O que mais nos impressiona é que além de fazer músicas, quadros e poemas, você tem uma loja de roupas e também é estilista. O que você pode nos falar sobre a Moonchild Vintage? 

Sempre amei roupas vintage. Cresci procurando lojas baratas e usando roupas antigas. A Moonchild Vintage naturalmente emergiu desse amor. Foi uma maneira para mim de ganhar algum dinheiro enquanto exercitava minha paixão por roupas, estilo e moda vintage.

Há alguns dias vimos à venda no eBay um dos cadernos de anotações do John. O que você acha desse tipo de atitude? E sobre aquela época, o que você poderia nos falar sobre os materiais de John e seus que foram perdidos e roubados? 

Na verdade aquilo foi retirado hoje. O caderno não é do John, mas sim um dos meus e foi roubado de nossa casa. Não posso dizer nada além de que o advogado do John está cuidado do caso.

Você tem planos de lançar mais alguma coisa no fim desse ano e em 2013? 

Vou tentar lançar minha coleção de gravações em 4-faixas antes do fim do ano, mas não deve sair antes do começo de 2013. Também estou trabalhando numa nova banda onde toco com Max Davies e outro amigo nosso também chamado Max. E além de tudo, estou trabalhando em coisas de escrita também.

Onde podemos encontrar mais do seu trabalho? 

No meu blog e na minha página do Bandcamp.

Há algo que gostaria de dizer para quem está lendo essa entrevista? 

Obrigada por serem tão legais. E mais do que qualquer coisa, apenas sigam seus corações e suas almas.






Desert In Shape é um filme conceitual gravado e dirigido pela amiga e ex-namorada de longo prazo de John, Toni Oswald. A capa e contracapa do álbum Niandra Lades And Usually Just A T-shirt são ambas cenas do filme. O filme em si dura 17 minutos e foi filmado no verão de 1992 na casa do john, em Hollywood Boulevard, no quintal da casa do pintor Greg Gibbs (amigo de John e Toni) em Malibu. É uma peça experimental com influências de Marchel Duchamp e Salvador Dali. Clara Balzary, filha do Flea, aparece nos primeiros 4 minutos e John apenas aparece no último minuto do filme. John está invocando o alter ego de Marcel Duchamp, Rrose Selavy. Além disso, duas de suas canções que mais tarde apareceram no Smile From The Streets You Hold, "Enter A Uh" e "For Air" compõem a música do fundo para o filme, juntamente com o "Nume Tutalar", de Maria Callas.

Elenco: John Frusciante, Toni Oswald, Clara Balzary e Matt Polish
Fotografia por: Gregg Gibbs


Entrevista realizada pelo Universo Frusciante - publicada em 09 de junho de 2014.

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