20 de julho de 2016

Flea libera cover do The Clash com John Frusciante na guitarra


Na madrugada de 20 de julho de 2016, Flea postou em seu Twitter um cover de "Washington Bullets" do The Clash. A música gravada em algum momento do final da década de 1990 nunca havia sido lançada - a versão conta com Flea cantando e tocando baixo, John Frusciante tocando guitarra, Stephen Perkins tocando bateria e os backing vocals a cargo de Cherie Westridge, presumivelmente um amigo do trio.




"Esse é um cover do Clash que eu fiz em algum momento dos anos noventa, que nunca havia sido lançado. Acho que foi para um disco tributo do Clash e os criadores do registro não acharam que [o cover] fosse bom o suficiente. Eu realmente gosto dele. Eu aprendi sobre Victor Jara a partir desta canção e eu amo Victor Jara - que sua alma seja abençoada. John Frusciante toca guitarra e Stephen Perkins toca bateria. Cherie Westridge fez os backing vocals. Eu toco baixo e canto. Paz para todos."
- Flea - 19 de julho de 2016








Para aqueles que não estão familiarizados com Victor Jara, ele foi um professor, diretor de teatro, poeta, cantor, compositor, músico e ativista político chileno, que foi preso, torturado e assassinado logo após o golpe militar de 11 de setembro de 1973 em sua terra natal e tornou-se um símbolo da luta contra a ditadura de Augusto Pinochet. O assassino de Jara foi finalmente considerado culpado nos mês passado.




Agradecimento: Invisible-Movement

John Frusciante antes do seu primeiro show com os Chili Peppers - 05 de Outubro de 1988

Anthony Kiedis, Flea, John Frusciante e D.H. Peligro em entrevista antes do primeiro show com Frusciante em 05 de outubro de 1988 - a apresentação ocorreu no Six Feet Under, Phoenix, AZ, EUA.




Tradução e Legenda: Pedro Tavares

Faixa a faixa: Stadium Arcadium - Red Hot Chili Peppers


O Red Hot Chili Peppers - Anthony Kiedis, John Frusciante, Flea e Chad Smith - comentam algumas das músicas do álbum Stadium Arcadium lançado em 09 de maio de 2006.








Tradução e Legenda: Pedro Tavares

Entrevista no ensaio do Grammy - Fevereiro de 2007


John Frusciante é entrevistado no ensaio da 49ª Edição do Grammy,  em fevereiro de 2007, e dá uma lição de humildade quanto o repórter pergunta sobre os lugares onde a música o levou e todo o reconhecimento por isso.



A última vez que falei com você foi durante o vídeo de "Fortune Faded", logo antes dos seus discos solo saírem. Se eu soubesse a genialidade daqueles discos, eu adoraria ter conversado com você antes. 

"Legal."

Eu fiquei impressionado com aqueles discos.

 "Legal, obrigado."  

Vamos falar sobre estar lá no palco. Você faz parecer fácil. O que se passa na sua cabeça quando você está lá em cima, tocando guitarra? 

"Nada. A ideia é desligar sua mente. A música vem pra você quando você não está pensando, e quando você aprende a se render à música. Não é sobre pensar ou planejar alguma coisa, você aprende a desligar sua mente gradualmente através dos seus anos de prática."



E você consegue fazer isso sabendo que tem milhões de pessoas, quando você está em TV internacional, você acha que consegue? 

"Esse é o truque, não pensar pelo ângulo dos outros. Porque você só pode experimentar algo pelo seu próprio ângulo, como uma pessoa individual. Eu não sei o que eu pareço ser para as milhões de pessoas assistindo, então eu não posso me preocupar com isso, eu só tenho que ser eu mesmo."


O que essas nomeações significam pra você a esse ponto, para a banda ter esse tipo de sucesso e prestígio a esse ponto? O que significa pra você e pra banda? 

"Significa que estamos sendo respeitados pela indústria em que trabalhamos. Quero dizer, não é? Não é isso que isso significa?"   

O quanto você está orgulhoso, pessoalmente, desse álbum? Eu sei que você trabalhou muito nesse.

"Eu trabalhei muito nele. É legal ser apreciado, é legal ser recebido pelo mundo e pela indústria da música. Sabe, é legal porque eu dei muito duro nele. Existem várias outras pessoas que também deram muito duro e não tiverem esse prestígio. Eu acho que cada um recebe seu próprio tipo de recompensa. Se fosse alguém que vendesse menos discos e que talvez não fosse tão reconhecido pelo mundo, poderia ter o mesmo prazer por ter dez amigos que amaram o que ele fez. Sabe o que tô falando? É bem relativo. Nesse caso, sim, nós vendemos uma quantia de discos o suficiente para sermos reconhecidos pelo... pelo Grammy's. É o meu lugar no mundo. Fico muito feliz por estar no meu lugar."

Que tipo de conversas... vocês falam sobre o sucesso e o reconhecimento a esse ponto e o que isso significa pra vocês, nessa estrada em que vocês estão? 

"Se nós conversamos sobre isso?"

O que vocês pensam quando... são nomeados ao Grammy's, vendem tantos discos, há um elogio coletivo entre vocês, ou vocês nem falam sobre isso? 

"É só... legal. Nós sempre gostamos de ouvir boas notícias. Eu sou um músico, eu penso em música, eu penso em livros... Eu não me perco muito na forma em que o mundo me enxerga. Não é tão importante. É como eu disse, eu tenho que me preocupar comigo mesmo. Sou uma pessoa com muitos problemas, com muitas coisas para aproveitar na minha vida, com muitas oportunidades para celebrar a alegria de existir. Sabe? Ser reconhecido, como eu disse, pela sociedade e pelo Grammy's é... é uma honra. Eu encaro isso do jeito que é. Não significa que eu atingi o ponto mais alto do meu valor artístico. Eu posso nem ser reconhecido quando eu atingir esse ponto. As duas coisas não são necessariamente relacionadas."

Falando nisso, você está sempre compondo, sempre trabalhando, você está trabalhando em um novo material para o seu trabalho solo, para a banda, isso é algo que está sempre acontecendo? 

"Sim, estou sempre trabalhando. Eu trabalho muito duro. Estou sempre pensando no próximo passo. Estou orgulhoso desse disco, mas, minha mente está sempre focada no que eu estou fazendo agora ou no que estou prestes a fazer. Uma vez que algo está feito e lançado, está fora das minhas mãos, e eu meio que... eu me desprendo dele. É legal ele ser recebido, mas eu sou meio que indiferente à ele, porque, se ele não fosse recebido, eu espero que eu ainda pudesse tão feliz comigo mesmo como pessoa como estou agora. Entende o que eu falo? Então, eu acho legal. Estou feliz com tudo isso, mas eu tenho que admitir que já virei a página."

Falando em próximo passo, o que você está fazendo? Trabalhando num disco solo de novo, trabalhando em alguma coisa com a banda, vocês ainda estão fazendo turnê?

"É, estamos em turnê, e isso já é muito trabalho para a banda se concentrar. Sim, estou fazendo um novo disco solo, e praticando muito guitarra."

O que você acha de dividir esse espaço com pessoas como Ornette Coleman? Eu sei que alguns ídolos da banda estarão aqui. É incrível.

"Eu tenho muito respeito por muitas das pessoas que estão aqui. Eu gosto muito do Justin Timberlake, eu gosto muito da Beyoncé, mas, Ornette Coleman, eu amo Ornette Coleman, ele sempre foi um dos meus favoritos, então estou muito excitado em estar aqui. Steve Vai está aqui, eu fiquei muito empolgado em ver as pessoas que estarão aqui. Muitas pessoas - Joan Baez -, muitas pessoas que eu respeito estarão aqui. Estou empolgado com isso. Vai ser legal. Eu escuto... meu tipo de música favorito é Aphex, AFX. É meu tipo de música favorito. Eu acho que ele é a melhor coisa que surgiu há muito tempo."

E quando você for tocar no Grammy's, você dá um gás novo na sua performance, você usa mais suas habilidades de showman, esse tipo de coisa? Num palco normal, você faz o show, mas quando é o Grammy's, você se apresenta de uma forma especial?

"Eu acho que geralmente nessas situações, você é mais auto-consciente, sabe. Espero que não seja assim, espero que eu consiga me deixar levar do mesmo jeito que nos nossos shows ao vivo. Mas essa música - Snow ((Hey Oh)) - não é... essa música não tem muito espaço para improvisações ou algo assim. Então só vamos subir lá e tocar a música. Não é nada demais. Pensar muito não ajuda, e exigir demais que seja "incrível" também não ajuda. Você só tem que se deixar levar e se render para as energias que estiverem no ar. E é isso que vai sair na música. Eu não tenho controle sobre isso. A música sai quando quer sair, e não sai quando não quer sair. E essa é a beleza em estar numa banda que toca ao vivo, contrário de alguém que apenas toca acompanhando as fitas e coisas assim. Nós estamos nos arriscando sempre que tocamos. Realmente tem a chance de ser algo muito bom ou muito ruim, todas as vezes que tocamos. É legal sermos consistentes o suficiente para que pessoas como os do Grammy's confiem em nós para subir no palco e tomar essa chance. Mas, não existem tantas maneiras diferentes dessa música sair. Só vamos subir e tocá-la. Não vai ser uma grande jam ou algo assim."

Por último, eles precisam que você volte, o que significaria para a banda ganhar esses Grammy's? Para o próximo passo?

"Nós ficaríamos felizes com isso, não iria significar nada para o próximo passo. Nosso próximo passo será qualquer música que tivermos vontade de fazer, quando fizermos. Eu acho que algumas pessoas ganham o prêmio, vendem muitos discos e eles decidem que "eu tenho que repetir isso, eu tenho que fazer a mesma coisa", e isso não é para nós. Você tem que seguir sua visão artística, onde quer que ela te leve. É ótimo ganhar Grammy's, te faz se sentir encorajado pelo mundo ao seu redor. É isso que me faria sentir, que o mundo... Quer dizer, eu já me sinto assim. Se não ganhassemos nenhum Grammy's, eu também sentiria que o mundo está me encorajando, nós fomos nomeados ao Grammy's. Isso é legal, sabe. Se ganharmos, será ótimo. Se não ganharmos, também será ótimo."

Tradução e Legenda: Pedro Tavares

Entrevista Fortune Faded - Outubro de 2003

John Frusciante é entrevistado na gravação do videoclipe do single "Fortune Faded" no Ambassador Hotel em Los Angeles em outubro de 2003.




Tradução e Legenda: Pedro Tavares

The Blairing Out - Julho de 1997

Entrevista realizada pelo programa The Blairing Out por Eric Blair em julho de 1997, com a participação de Keith Morris, conhecido por bandas como Black Flag e os Circle Jerks - além disso, ele emprestou sua casa para a gravação.

Nessa entrevista, John Frusciante fala sobre a fama nos Red Hot Chili Peppers, sua disciplina, drogas, seu primeiro álbum solo e o segundo que ainda viria a ser lançado - "Smile From The Streets You Hold" em agosto de 1997 - e possíveis novas turnês.




Tradução e Legenda: Pedro Tavares

Os novos deuses da guitarra - Rolling Stone - Fevereiro de 2007


John Frusciante, John Mayer e Derek Trucks - os novos deuses da guitarra - conversam durante uma jam para revista Rolling Stone de fevereiro de 2007.







Tradução e Legenda: Pedro Tavares

Prenda seus ídolos - Maio de 2016


PRENDA SEUS ÍDOLOS: John Frusciante sobre a fama, free jazz e a genialidade de Public Enemy

Jerry Judelson foi um estagiário de marketing na agência de comunicação Mass Appeal quando teve a oportunidade de entrevistar seu ídolo, sem saber onde sua relação com o músico recluso iria dar. Um ano depois, ele compartilha suas raras conversas com o tímido deus da guitarra convertido em empunhador de sintetizadores, abrangindo o hip hop, Ornette Coleman, e por que ele pode nunca mais tocar ao vivo.

John Frusciante passou por muitas evoluções em sua carreira. Ele entrou para sua banda favorita, os Red Hot Chili Peppers, como guitarrista em 1988 aos dezessete anos. Ele passou os próximos vinte anos entrando e saindo da banda, experimentando todos os altos inimagináveis e os baixos perturbadores que o estrelato do rock and roll tem a oferecer. Através disso tudo, ele permaneceu um produtivo artista solo, com seus álbuns partindo desde os experimentos em quatro pistas devastados pelas drogas de Niandra LaDes and Usually Just a T-Shirt (1994) ao xamanismo folk-rock acústico de Curtains (2005) e a envolvente obra-prima de estúdio The Empyrean (2009).

Após deixar os Chili Peppers pela última vez em 2007, seus trabalhos solos começaram a abranger estilos completamente novos: electro-pop experimental, acid house, uma fusão de jungle-rock atonal, e hip-hop old school. Seu último lançamento, o EP The Foregrow, lançado mês passado pelo Acid Test, é uma seleção de faixas criadas durante 2009 e 2010, um período em que Frusciante tinha apenas começado a usar o DAW Renoise para gravar e editar suas loucas jornadas com sintetizadores. Para quem já é fã de suas criações modulares, é um disco que vai encantar e deliciar. Para qualquer outro, bem vindo ao mundo de Frusciante.

A primeira vez que eu escutei uma música de seu catálogo solo foi em 2010. Era um lindo e calmo domingo durante as férias do Dia de Ação de Graças e eu estava em casa durante meu primeiro ano na Wesleyan University. Era meio da tarde e eu estava fumando um baseado no dormitório do meu amigo na Columbia. Nós achamos que seria engraçado irmos chapados até o Planetário Hayden. Ele colocou no som o Shadows Collide With People, o disco solo de Frusciante de 2004. Olhando para trás, após escutá-lo centenas de vezes, eu ainda lembro da força que me invadiu quando a primeira música do disco, "Carvel", com o clique quase inaudível do chimbal, mergulhou de cabeça num hino do rock and roll incomparável e desprovido de ego. Foi algo espiritual e visceral diferente de tudo que eu já tinha escutado. Cada faixa me levava cada vez mais fundo dentro daquele mundo de brilhantes paisagens sonoras e esqueletos de canções pop.

Na época, eu estava lutando na universidade contra um triunvirato em saúde mental de ansiedade, compulsões, e depressão. E ainda que essa primeira escutada ao Shadows tenha sido a respirada que eu precisava, ela não durou muito. Eu voltei a Connecticut para a segunda metade do semestre e um inverno amargo me jogou num buraco escuro. Eu não saia muito do meu quarto além de ir para a aula. Eu passava horas gritando em travesseiros e aprendi como fumar maconha de verdade. Durante esse tempo, por razões que apenas há pouco tempo eu comecei a entender, Frusciante tornou-se importante para mim. Eu fiz dele o meu ídolo, uma lenda, mas também um amigo de confiança. Sua história tornou-se minha paixão - o rockstar que tornou-se o autor recluso, o viciado que tornou-se espiritualista, o guitarrista que tornou-se eletrônico. Nenhum número de entrevistas no YouTube conseguia saciar minha adoração. É algo esquisito quando você venera uma pessoa pública - você sente que a conhece, no entanto o atrativo de toda essa troca é que você nunca a conhece de verdade. Elas nunca podem ser realmente suas amigas.

Eu me formei na universidade em 2014, o mesmo ano em que Frusciante começou a lançar hip-hop com os Black Knights, um duo de rap associado ao Wu Tang que ele tinha conhecido através de RZA. Em 2015, eu estava estagiando na agência de comunicação "Mass Appeal" quando o segundo álbum da colaboração foi anunciado. Meu estágio era em marketing, e embora eu não quisesse necessariamente ser um jornalista de música, eu não estava descartando a opção. Quando eu lancei ao editor a proposta de um review sobre o LP ainda a ser lançado, The Almighty, ele sugeriu que eu tentasse uma entrevista. Eu contatei o Black Knights, que atendem aos nomes de Rugged Monk e Crisis the Sharpshooter. Eles concordaram em um telefonema e eu reuni coragem para perguntar se John poderia se juntar. "eu tenho certeza que ele não está fazendo nenhuma parada de mídia," Crisis respondeu.

Eu tentei tranquilizá-lo. "Se ele está um pouco com medo de que será outra entrevista como a do Heavyweights Radio onde eu não sei nada sobre ele, você pode garantir a ele que esse não vai ser o caso. Nenhuma pergunta sobre os Chili Peppers".

Ele respondeu: "Ele é bem particular. Não temos vergonha de perguntar a ele mas ele não tem vergonha de dizer não".

Eu sabia disso. Eu me sentia culpado pela expectativa de tentar impor algo a ele, e egoísta, por tentar falar com ele. Eu me sentia desqualificado até para pedir. Ainda assim, eu já tinha pedido. Não parecia ser realista ele dizer sim - se eu conseguisse isso, então por que ninguém mais conseguiria? Apesar de minhas dúvidas, deu certo. Eu fui contatado por alguém do seu selo, e dois dias depois, John e eu iríamos conversar pelo telefone.

"QUANDO EU ESCUTEI O SEGUNDO DISCO DO PUBLIC ENEMY, A PRODUÇÃO DELE ME IMPRESSIONOU"

Eu passei os próximos dois dias constantemente me perguntando: "O que porra eu estou fazendo?" Aquilo tudo era perfeito demais, e me assustou. Mas eu me preparei bem. Eu retornei a todas as entrevistas antigas, e as novas. Eu perguntei ao meu amigo do planetário Jacob quais perguntas ele faria. Eu não conseguia me impedir de enxergar esse momento como decisivo, um tipo de realização narrativa no arco da minha relação com John e sua música. O que essa coisa iria significar para mim? Era o fim da história ou o começo? Como eu faço pra que ele saiba o que sua música significou pra mim?

Quando chegou a hora de ligar para ele, eu respirei fundo e disquei. Eu me sentia como um vigarista até o momento que ele atendeu.

"Aqui é o John". Foi esquisito escutar a voz falando comigo, a mesma voz que eu tinha passado milhares de horas escutando. Passamos duas horas falando, e já que o contexto da entrevista era seu novo álbum, eu comecei perguntando como ele tinha entrado no hip-hop.

"Inicialmente eu não estava interessado em hip-hop, porque eu era um garoto interessado em aprender a tocar guitarra e admirar bateristas, e drum machines simplesmente não me pareciam tão expressivas como bateristas de verdade", ele lembrou. "Então eu escutei o segundo disco do Public Enemy, e a produção dele me impressionou. Eu não fazia ideia que sampling e drum machines poderiam ser tão expressivas. O que Hank Shocklee estava fazendo ali era tão extraordinário de um ponto de vista musical, criando essa colagem de tantas coisas diferentes e transformando pequenos pedaços de música em uma obra de arte".

Primeiro, ele ficou "intrigado" com como a música passava a existir, mas com os anos ele começou a entender os aspectos técnicos de sampleamento e descobrir as capacidades expressivas que isso possui. Sua primeira incursão ao sampleamento foi "Sect in Sgt", uma síntese de 15 minutos de breakbeats, samples de rock clássico e musique concréte. Ele ouviu a canção inteira durante um sonho e tentou replicá-la com precisão. Achar seu caminho para dentro da música baseada em samples o fez perceber que ele poderia tentar fazer hip-hop também, como ele fez num trio de álbuns com o duo de rap associado com o Wu Tang, o Black Knights.

"Música como Autechre, Venetian Snares, Aphex e Squarepusher, é uma extensão do que Hank Shocklee esteve fazendo com Public Enemy", ele explicou. "Essa música parecia simplesmente sair do ar através de mágica ou algo assim". (Sua crença em uma fonte quase mística de criatividade humana foi mencionada em conversas várias vezes.)

Conversando sobre o Black Knights, ele parecia nervoso em dizer a coisa certa, e admitiu abertamente que sua parceria com Rugged Monk e Crisis foi um encontro incomum. "Existem várias coisas em cada um que nós nunca iremos entender. Em várias maneiras eu acho que sou um mistério para eles, e eles certamente são um mistério para mim". Não houve dúvidas no estúdio, no entanto - os rappers o confiaram com toda a parte da música, e ele confiou neles com todas as rimas.

"MÚSICA COMO AUTECHRE E VENETIAN SNARES É UMA EXTENSÃO DO QUE HANK SHOCKLEE ESTEVE FAZENDO COM PUBLIC ENEMY"

"No mundo do rock, existem muitas segundas opiniões, pessoas sendo inseguras e pessoas contratando produtores para fazê-los serem melhores do que são. Monk e Crisis não precisam de nada desse tipo. Eles acreditaram no que tinham escrito e foram até o microfone e cantaram. Eu sempre tive esse mesmo tipo de confiança como um guitarrista". Ao reconhecer cada um como opostos, cada lado da relação tornou-se mais inteiro. "Eu sempre tive amizades assim", ele gaguejou, "onde tentamos encontrar uma paz ao discutir um com o outro. Não sobre música - nossos papéis aí são especificamente definidos - mas sobre a vida, a raça, política ou convenções sociais".

Após falar sobre hip-hop, eu mencionei seu interesse em free jazz - um gênero que pode ser visto como um projeto de liberação política e social, assim como musical. Frusciante tocou progressões de acorde ao estilo de Alice Coltrane e solos de guitarra ao estilo de Sonny Sharrock no EP Outsides, e até tem uma tatuagem da capa do disco do mago do free jazz Ornette Coleman, Dancing in Your Head. Coleman tinha morrido algumas semanas antes da nossa entrevista, então eu perguntei se ele tinha algumas palavras pra falar sobre ele.

Ele pausou. "Você está brincando. Eu não sabia disso!". Eu me desculpei por ser o portador das más notícias. Ele estava aturdido. "Caralho, eu sempre acabo descobrindo sobre as pessoas tipo duas semanas depois. Nossa, bem perto de Charlie Haden, também". Eu perguntei como a música deles o tinha influenciado mas ele estava sem palavras; a notícia tinha acertado-o como um caminhão. "Eu estou muito chocado com o Ornette. Posso ligar de volta?". Ele desligou.

Eu recebi a ligação de volta no outro dia. Ele começou dizendo que não queria falar sobre Coleman, mas apenas alguns minutos passaram antes que ele retornasse ao assunto naturalmente. "Para mim como músico, o importante é aproveitar o máximo possível da história", ele disse. "Coleman encontrou a liberdade porque ele entendia a tradição, e ele cresceu e aprendeu e ensinou sua vida inteira porque ele tinha isso. Ele era uma pessoa gentil, uma pessoa humilde, e uma pessoa tímida e suave. Como músico, ele parecia ser um tipo de anarquista ou algo assim, mas a razão dele ter sido capaz de progredir através de sua vida inteira e ser tão bom quando tinha oitenta anos do mesmo jeito que quando tinha trinta é que ele nunca parou de se educar".

"Músicos nunca devem parar de estudar", ele continuou. "Você só vai conseguir ganhar dinheiro se tocar material original. Isso dá uma ideia bem estranha na cabeça dos músicos, e parece que no hip-hop especialmente, não há o entendimento desse tipo de aprendizado - esse tipo de aprendizado que todo músico de jazz tem que ter, que todo músico de folk tem que ter, que todo músico de rock tem que ter quando está começando, que é passar anos tocando a música dos outros. E com o rap, com meus amigos, eles estavam escutando um CD do The Chronic ou 36 Chambers, e quando eu estou tocando guitarra junto com eles e Monk está rimando junto, quando nós fizemos isso juntos era como se estivéssemos aprendendo juntos. Era como se o professor estivesse falando pelos alto-falantes e nós fossemos os estudantes".

Ao final da nossa segunda ligação, tudo que eu queria fazer era tocar junto com alguns dos discos de Frusciante.

"EU NÃO QUERO FAZER UM ESPETÁCULO DE MIM MESMO DA MANEIRA QUE EU FAZIA QUANDO ESTAVA NO RED HOT CHILI PEPPERS"

Por meses, eu ignorei a situação. Eu usei uma única citação numa matéria para a "Mass Appeal" e segui para fazer outra reportagem. De algum jeito, eu sentia que enquanto eu mantivesse a entrevista fora do olho do público, nossa relação era uma amizade autêntica ao invés de um compromisso profissional.

Menos de um ano depois, John anunciou ao mundo que estaria lançando o EP Foregrow. Eu me senti incapaz de ter seu número no meu celular e não usar. Sem pensar eu lhe enviei uma mensagem para saber se ele falaria comigo sobre o novo disco. Eu esperei um dia e ele concordou: "Claro".

Dessa vez as coisas se saíram mais naturalmente. Ele sabia que nossa última entrevista não tinha resultado em nada além de uma única citação. Ele pareceu meio confuso. Por que esse garoto teria feito uma entrevista de duas horas para apenas uma miserável citação?

Rumores diziam que o EP Foregrow era influenciado por John Carpenter e movimentos de dança. Acontece que era apenas para atrair nerds de música. Ele rapidamente afastou ambas declarações, me assegurando que quando o EP foi gravado em 2009, ele não tinha nem escutado as músicas de sintetizador do diretor de filmes de horror nem do estilo de dança de Chicago, embora desde então ele tenha se interessado no último. Esse incidente mostra como Frusciante adora se esconder em sua arte, particularmente sob seu novo aspecto. "Eu sempre fui muito cuidadoso em como incorporar a guitarra na música eletrônica. Eu não quero fazer um espetáculo de mim mesmo como guitarrista da maneira que eu fazia quando estava no Red Hot Chili Peppers. Eu quero estar dentro da música, e não do lado de fora para chamar sua atenção".

O EP saiu no selo Acid Test de LA, administrado por Oliver Bristow. "Ele escolheu as músicas, não eu," disse Frusciante. "As músicas no disco Trickfinger foram gravadas em 2007, embora no álbum diga que foi gravado em 2008 - aquilo foi um erro. E em 2009, após eu já ter começado a trabalhar com Aaron Funk [Venetian Snares], eu parei de gravar direto das máquinas para o mixer, depois um gravador de CD, e passei a gravar no computador pelo Renoise. Ainda usando minhas máquinas, mas o Renoise se tornou o gravador para que eu pudesse fazer overdubs e coisas como na segunda música, "Expre'act", onde o andamento está constantemente mudando. Isso é algo que eu estava doido pra fazer, porque é algo em que o Autechre fez coisas maravilhosas, e o Venetian Snares também. Isso é algo que você não pode fazer se está simplesmente sincronizando todas suas máquinas sem um relógio mestre vindo do computador".

Parecia que John havia preparado seus tópicos sobre o álbum, e ele foi bem direto, o que parecia esquisito. No fim da nossa entrevista ele pediu desculpas por ter bebido muito café. "O que também foi muito empolgante pra mim sobre ter um computador foi o fato de eu poder fazer o que equivale a editar, que é quando uma seção da música é totalmente diferente da próxima seção", ele continuou, cafeinado. "Eu sempre gostei no rock progressivo quando uma banda tipo Yes tem uma canção longa com várias seções que claramente não tinham sido feitas de uma vez só. Quando a atmosfera e o ambiente inteiro são completamente diferentes e são como canções diferentes. Eu estava tentando fazer essa mesma coisa dentro uma canção de seis ou sete minutos". Há uma falta de um bom rock progressivo hoje em dia, ele concordou, "e o que finge ser isso é besteira. Eu não considero como rock progressivo, é tudo idiotice de heavy metal ou o que seja".

Apesar de sua participação em uma das maiores bandas do mundo, ele é cauteloso ao descrever sua música recente como "um monte de solos de guitarra esquisitos anti-rockstar". Ele continua, "As improvisações de Kurt Cobain são solos bem impressionantes porque é mais sobre sua energia, seu relaxamento, sem tentar impressionar com dedos rápidos ou o que seja. Sem aderir a coisas como permanecer em uma nota só - só tocar a nota que você quiser. É assim que é na música eletrônica". O ideal anti-rockstar de Frusciante é uma rejeição do estilo altamente técnico de tocar guitarra que dominou as ondas aéreas nos anos 70 e 80. "É por isso que eu sempre fui muito cuidadoso ao incorporar guitarra na música eletrônica. Eu não queria fazer um espetáculo de mim mesmo como um guitarrista da mesma maneira que eu fazia quando estava no Red Hot Chili Peppers. Eu queria estar dentro da música, não do lado de fora para chamar sua atenção."

"OS MELHORES MÚSICOS MUITAS VEZES TEM QUE SE ESCONDER PARA SEREM ATRAENTES AO PÚBLICO. ERA NO QUE DAVID BOWIE ERA UM MESTRE"

Sua voz inconfundível lhe fez ter dificuldades similares. Quando mostrei aos meus amigos a música eletrônica de Frusciante, eles dificilmente acreditaram que era o cara dos Chili Peppers - até que ele começou a cantar. Seus backing vocals eram um componente essencial dos sucessos populares da banda; é difícil remover-se quando o mundo já escutou tanta coisa de você.

Numa postagem recente em seu website, ele escreveu sobre um conjunto de normas líricas que começaram a se amalgamar para ele em 1997 - uma filosofia que permitiria que ele escondesse sua individualidade, como ele explicou. "Eu estava vivendo na casa de uma mulher que era uma bruxa e uma ocultista, e ela me deu uma cópia do Book of Lies de Aleister Crawley. Eu estava lendo aquilo e eu também tinha o livro que a esposa do Ian Curtis escreveu [com as letras do Joy Division atrás] e vi uma conexão entre os dois, que era que a pessoa estava escondida, a personalidade estava oculta, e eles não iriam se dar ao trabalho de explicar o significado do que eles disseram. E ainda assim você sente que eles estão revelando mais de si mesmos do que estariam se estivessem cantando alguma balada romântica, sentimental ou algo assim".

O aspecto chamativo da sua fama enquanto no rock ainda parece pairar alto como um obstáculo percebido à criatividade de Frusciante. É claro, sempre foi. Nas velhas entrevistas que eu assisti tantas vezes, ele sempre rejeita que "a imagem é o que vale", a ideia do artista como um objeto, um culto da personalidade.

"Você não pode ser atraente às pessoas e ser sincero ao mesmo tempo. Muitas vezes os melhores músicos tem que se esconder para serem atraentes ao público. Era no que David Bowie era um mestre. Ele estava se escondendo o tempo todo. Ele sempre era entrevistado como um personagem, e ele estava escondido como uma pessoa dentro desse personagem. E eu acho que esse era a maneira correta de lidar com um mundo onde é entendido que se você quer o apoio de uma gravadora, você tem que se vender. Se você vai ser falso e você vai ser insincero, transforme isso em uma forma de arte! E foi isso que o Bowie fez. Mas nem todos tem esse talento".

Ele gosta da entrevista de 1971 de John Lennon para a Rolling Stone, em que ele repudia a mitologia dos Beatles, fala merda de seus ex-colegas de banda, e diz que seus fãs são um monte de burgueses hipócritas. Frusciante pode não ter o mesmo tom sarcástico e político de Lennon, mas ele quer falar com seus fãs de uma maneira semelhante, para dizer a eles que seu ídolo é uma miragem. Foi o que Frusciante quis dizer quando disse que "não faz mais música para o público" - ele não estava se referindo a indivíduos, mas o público de forma mais ampla, a força social monolítica que limita e define o que é arte popular. Ele desejava destruir essa influência.

A última pergunta que lhe fiz foi sobre a performance ao vivo - porque não era mais atraente para ele? Seu último show solo foi em 2005, mas de maneira egoísta, eu mantive esperança de um dia vê-lo tocar.

"A música vem de dentro do músico", ele respondeu, "e quando você está em turnê, você está ciente o tempo todo da impressão que você está passando às pessoas olhando pra você e ouvindo você. Lhe dá a sensação de ser um objeto. E eu acho que a maioria dos músicos estaria mentindo se dissessem que não enxergam, após fazer turnês por um longo tempo, o próprio público como um monte de objetos. Eles objetificam você, e você por sua vez objetifica eles. Eles respondem da mesma maneira para as mesmas coisas todas as noites. Eles parecem máquinas, a um certo ponto".

Não me surpreende que ele se sinta mais confortável fazendo música com máquinas, hoje em dia. As pessoas tentam desesperadamente não serem robóticas, e ainda assim quando são parte dessa multidão, é exatamente o que elas se tornam. A noite após a nossa segunda conversa, eu fechei meus olhos com Shadows estourando meus headphones e escutei um verso que nunca tinha feito muito sentido pra mim antes: "Omitir-me como um favor a Deus. Sofrer o destino porque é o único elevador que você tem". Eu percebi que, assim como a humildade de Ornette Coleman lhe permitiu ser um visionário, Frusciante tenta manter seu ego fora de sua arte, na esperança de ser um veículo para algo maior.


See in english: www.factmag.com/2016/05/14/john-frusciante-interview/

Tradução: Pedro Tavares
Fonte: Fact Magazine - 14 de maio de 2016

John Frusciante está construindo algo melhor que o mundo real - Abril de 2016


JOHN FRUSCIANTE ESTÁ CONSTRUINDO ALGO MELHOR QUE O MUNDO REAL

SEE IN ENGLISHthump.vice.com/en_uk/article/ae87we/john-frusciante-is-building-something-better-than-the-real-world

John Frusciante está tendo um dia ruim. Ele praticamente afirma isso quando repele a primeira pergunta que lhe faço pelo telefone "O que você esteve fazendo hoje?" com um gemido "Eu não vou falar sobre isso". Gaguejando, eu explico que a pergunta era apenas para "quebrar o gelo", uma maneira fácil de soltar o clima antes de submergirmos nas águas geladas do seu último lançamento de eletrônica, um EP pelo selo Acid Test de Los Angeles chamado Foregrow. "Não é fácil", diz Frusciante, "não é algo que eu queira falar para o público".

Através dos anos, o ex-guitarrista do Red Hot Chili Peppers experimentou coisas que ninguém deveria vivenciar sob os olhares da sociedade inteira. Após entrar na banda em 1988, ele deixou o grupo no meio de uma turnê do álbum esmagador de 1991, Blood Sugar Sex Magik, sobrecarregado pela experiência da repentina ascensão à fama. Ele se afundou em um período de vício em drogas e doença mental, batalhas mostradas em um documentário por Johnny Depp e em entrevistas publicadas nacionalmente (em um artigo de 1996 de um jornal do Arizona, ele termina com: "Eu não ligo se eu vivo ou morro"). Ele perdeu um amigo, o amado ator River Phoenix, para uma overdose de drogas do lado de fora de um show que Frusciante tocou no Viper Room, em Los Angeles, em 1993. De acordo com a autobiografia do antigo colega de banda Anthony Kiedis, ele finalmente abandonou as drogas em 1997, após entrar na reabilitação. Mas mesmo durante os últimos cinco anos, durante os quais ele esteve relativamente quieto, ele lutou contra perseguidores no tribunal, e está atualmente no meio de um caso de divórcio que tornou-se público após o TMZ descobrir registros de tribunal sugerindo que sua ex-esposa Nicole Turley está pedindo dezenas de milhares de dólares - mensalmente - de pensão.

Perdido por trás de todo o drama dos tabloides, está o trabalho solo verdadeiramente singular que ele fez durante seu tempo fora da banda que o tornou famoso. (Frusciante juntou-se novamente ao Red Hot Chili Peppers para outro dos seus períodos de maior sucesso de 1998 até 2009, mas saiu mais uma vez quando seus "interesses musicais [o conduziram] a uma direção diferente"). Com os anos, ele brincou com música ambiente distendida, guitarra pop jovial, estranhos projetos caseiros, acid house, e agora seus experimentos eletrônicos amplamente inclassificáveis - parecendo seguir todas as suas fantasias muito além do seu fim lógico, e sem nenhum público específico em mente. Foregrow, que ele lançou no Dia da Loja da Disco, é composto de confusas programações de drum machines, maravilhosos padrões de frases de sintetizadores, e uma balada vocal cuja letra ele descreve como uma "vívida memória pré-vida." Em sua sedutora estranheza, se assemelha a uma atraente conversa por trás de um espelho falso; ele consegue enxergar através, mas até seus fãs mais devotos terão que se esforçar para ver além do reflexo.

Após esforçar-se além das (não) gentilezas, o que Frusciante irá falar - excitadamente - é sobre a agitada música que ele esteve fazendo desde que mergulhou de cabeça no mundo da programação eletrônica analógica há quase uma década. Sua abordagem sobre lançar esses trabalhos é casual - a atraente bomba de fractais de acid house de 2015 Trickfinger na verdade foi gravado em 2007, e o recém-lançado Foregrow foi gravado em 2009 - mas ele trabalha com eles como parte da sua rotina diária, em casa, longe do resto do mundo. Em conversas, é provável ele escapar à tangente e falar sobre programar sintetizadores modulares, ou dos desafios específicos de trabalhar na mesma sala com alguém tão meticuloso como ele (recentemente, ele está falando de Aaron Funk do Venetian Snares, com quem ele tem um projeto chamado Speed Dealer Moms). Ou ele irá se deixar levar falando sobre as progressões de acordes de canções dos Beatles ou do Genesis. Ou, como ele fez no meu caso, simplesmente desistir de falar.

Nossa primeira entrevista numa tarde do meio de abril foi interrompida após apenas dez minutos, quando Frusciante se sentiu incapaz de expressar-se de maneira apropriada, distraído com o que quer que tenha ocupado sua manhã no dia em que eu liguei. Mas dois dias depois, ele voltou, oferecendo meditações sobre a maneira como sua obsessão em fazer música interage com sua vida, tanto em seus bons como seus maus momentos. Leia nossas conversas editadas abaixo:

THUMP: Eu li que Foregrow foi feito em 2009. Você tem muito material que está simplesmente guardado?

John Frusciante: Ultimamente eu tenho feito muita coisa assim. Eu estava fazendo músicas [em 2008 e 2009] sem a intenção de lançar. É uma maneira de pensar que eu acho realmente valiosa quando se quer aprender, sem ter a consciência de saber que vai ser para as outras pessoas - quando é só pra você e seus amigos.

Mas ultimamente, nos últimos quatro ou cinco meses, eu comecei a fazer um material que eu enxergo como relacionado conceitualmente - e aí até as músicas que eu estava fazendo em 2014 acabaram sendo relacionadas conceitualmente. O que eu tenho feito nos últimos anos foi inesperado e revelou-se para mim ao invés de eu tentar conseguir alguma coisa.

Então você está dizendo que esse lançamento e o Trickfinger de 2015 não foram feitos para serem consumidos pelo público?

Sim, não mesmo. Eles eram especificamente para aprender. Quando uma banda vai ao estúdio fazer um disco, há uma pressão ao redor e a consciência do fato que você está fazendo aquilo para um público específico. Quando você elimina isso da equação, você se encontra sendo mais aventureiro. Muitas vezes é dessa forma para músicos antes de ficarem famosos; é aí que muito do crescimento acontece.

Existe alguma coisa específica que você estava escutando ou pensando enquanto fazia esse material novo? É até estranho falar sobre o Foregrow porque ele provavelmente não é de onde a sua cabeça está hoje em dia.

É... eu consigo. Na verdade, eu me sinto bem desconfortável em conversar... Quer saber? Me desculpe. Isso não tem nada a ver com você, eu só não estou com uma cabeça boa hoje e eu estou vendo que essa entrevista não vai sair boa então eu vou ter que desistir dela.

Tem certeza? Você pode levar essa conversa do jeito que você quiser.

Eu estava com a cabeça muito ruim antes dessa entrevista e estava me perguntando se eu devia ou não fazê-la e eu não queria cancelá-la tão tarde. Mas eu tive uma manhã difícil. Eu realmente não estou em nenhum estado pra dar uma entrevista.

Me desculpe se alguma coisa que eu fiz lhe fez se sentir pior.

Não. [Não foi] absolutamente nada que você estava fazendo. Eu estou com a cabeça em outras coisas agora. Eu pensei que talvez a entrevista fosse me distrair de... para ser honesto com você, sua primeira pergunta, o que eu estava fazendo antes de você ligar - eu estava lendo um livro, um livro de 900 páginas que estou na metade e que estou obcecado. E eu estava lendo o mesmo parágrafo diversas vezes. Meu cérebro não vai conseguir se concentrar no momento porque estou distraído com outras coisas.

[No dia seguinte, um representante do selo me mandou um e-mail às sete da noite para me dizer que John gostaria de falar comigo de novo, mas que tinha que ser agora. Uma busca apressada no Google não resultou em nenhuma informação relevante sobre o que poderia estar acontecendo na vida pessoal do John, mas uma busca nos registros da vara de família de Los Angeles sugere que há outra audiência do seu divórcio em andamento planejada para esse mês. Dito isso, John nunca me confirmou se era isso que estava ocupando sua mente. Eu lhe ligo mais uma vez.]

Como você está? Está se sentindo melhor?

Sim, eu me sinto bem hoje.

Você pode falar sobre o que estava pesando em sua mente?

[Risos] Eu não dou entrevistas sobre minha vida pessoal, sabe?

Talvez essa seja outra maneira de falar sobre isso: sua música sempre pareceu ser essa sublimação do que está se passando na sua vida no momento. Isso é uma caracterização justa?

Eu deixei de compor canções da maneira tradicional há muito tempo. Nessa época, talvez as letras fossem um vislumbre do que estava se passando na minha mente. Mas sobre o que eu faço com música eletrônica, é simplesmente uma parte natural da minha existência. Tenho certeza que reflete minha vida, tenho certeza que reflete as coisas que eu estou pensando, mas muito dessas coisas são tipo... números.

Eu tenho pensamentos que são completamente musicais. Eles consomem muito do meu cérebro. Eu acho que muitas vezes na minha música, estou tentando preencher os vazios que eu vejo nas músicas que as outras pessoas fazem. Como eu sou um amante de todos os tipos de música de todas as épocas diferentes da história, eu enxergo boas ideias musicais em que na minha mente há muita coisa a se fazer antes delas serem completamente exploradas. Eu tento preencher esses buracos várias vezes, preencher esses vazios.

É por isso que, por exemplo, você estava fazendo acid house em 2007?

Bem, aquilo foi só pra aprender o vocabulário, sabe? Quando você toca guitarra, você está fazendo uma única coisa o tempo todo, mas quando eu estava fazendo aquele acid house, eu estava tocando 15 máquinas ao mesmo tempo; você tem que se acostumar com ter um monte de coisas na cabeça ao mesmo tempo. Muitos dos meus heróis na música eletrônica, como Aphex Twin e Squarepusher - assim foi o começo deles, então eu pensei que se eu vou passar o resto da minha vida sendo um compositor no sentido moderno, então eu precisava aprender como começar tudo aquilo.

O desejo de aprender essas novas formas é uma grande parte do seu impulso de fazer música atualmente?

Estou constantemente tentando entender mais e constantemente tentando dificultar as coisas pra mim mesmo, para criar desafios. Eu faço essa coisa em que eu começo a construir uma música e então eu a destruo [para que] eu tenha o desafio de reconstruí-la de um jeito novo. É uma das grandes coisas da música eletrônica em comparação à musicalidade tradicional: você se torna capaz de ir e voltar com as máquinas. Você não sabe exatamente para onde está indo.

Nesse sentido, fazer música eletrônica é seu modo de escapar?

Escapar de quê?

De estar sempre dentro da sua cabeça. Das coisas mundanas da vida...

Não existe muito de uma pessoa em mim. Nunca houve. Eu me imagino como um tipo de não-pessoa. Olhando pra minha vida, eu quase sempre estive em casa com a arte e a criatividade. Da perspectiva de outra pessoa pode parecer egoísmo ou que eu esteja tentando escapar do mundo real, mas pra mim, o mundo da arte e da música é o mundo real e o resto é um lugar que eu não entendo de verdade.

Sempre foi assim?

Quando criança, com uns 11 anos, eu comecei a achar que estava enlouquecendo. Eu comecei a achar que eu seria alguém que acabaria assassinando uma pessoa sem ter a habilidade de impedir a mim mesmo. Minhas interações com seres humanos eram tão difíceis que estava começando a me parecer que eu estava perdendo o controle da minha mente. E foi aí que eu comecei a tocar guitarra. Eu passei a ser um cara que gostava estritamente de punk rock para alguém que amava a música dos anos 60 e todos aqueles ideais. Então eu não conseguia mais me imaginar matando alguém ou nada desse tipo.

Era isso que estava acontecendo dentro de mim. Era isso que o mundo estava criando dentro de mim sem aquele recurso de criação. Eu consigo liberar muita coisa ao fazer música que eu acho que a única outra maneira de liberar seria fazendo coisas que são destrutivas para outras pessoas ou destrutivas para mim. Definitivamente existe uma parte de mim que precisa ser deixada sozinha e escondida do resto do mundo.

Então a música tornou-se uma estrutura para que você interagisse com o mundo.

Não apenas isso, mas o fato de que eu tive muita sorte com as pessoas do negócio que estiveram comigo durante minha carreira me libertou de ter que pensar nos aspectos mundanos da vida. Nesse ponto da minha vida, pelos últimos 8 anos ou mais, por causa de todo o trabalho duro que eu fiz e que eles fizeram, eu sou geralmente uma pessoa que consegue decidir o que quer passar o dia fazendo, todos os dias.

Eu realmente não acho que eu viva no mundo real que muitas pessoas vivem. Eu entrei na indústria da música aos 18 anos, e eu nunca tive que trabalhar a não ser colhendo ervas para o meu avô, varrendo as pedras da garagem, alimentando os cavalos e coisas assim. Esse foi o único emprego que eu tive na minha vida antes de estar no Red Hot Chili Peppers. O que seria uma fuga para outras pessoas é simplesmente o meu habitat natural.

Existe alguma coisa na música eletrônica que fez dela especialmente absorvedora nesse sentido? Tem sido sua principal fonte de auto expressão pela maior parte de uma década recentemente.

É difícil explicar para pessoas que não sejam elas mesmas musicistas devotadas. Esteja eu praticando acompanhando algum disco, ou fazendo minha própria música, eu tenho a sensação de estar entrando em alguma coisa do mesmo jeito que se entra numa casa e se separa do mundo. Eu percebo isso especialmente usando coisas como o sintetizador modular ou o Elektron Monomachine ou o Roland MC-202. Quando estou fazendo música, eu deixo de existir, mas também o mundo lá fora deixa de existir e eu estou num mundo que eu criei.


Tradução: Pedro Tavares
Fonte: Thump - 28 de abril de 2016

John Frusciante, Michael Rother e Josh Klinghoffer - Knitting Factory - 2004

- Electro-Harmonix Big Muff PI
- Digitech PDS-1002 (2X)
- Electro-Harmonix Holy Grail Reverb

John Frusciante, Flea, Josh Klinghoffer e Stella Mozgawa - Troubadour - 2008


Guitarras:
1962 Fender Stratocaster
1955 Fender Stratocaster - apenas presente, não usada na apresentação.

Pedais:
- Boss DS-2 Turbo Distortion
- Dirty Boys Afro Fuzz (?)
- Electro-Harmonix HOG Harmonic Octave Generator
- Moogerfooger MF-105
- Ibanez WH-10 (V1)
- Electro-Harmonix Holy Grail
- Ernie Ball Volume
- Boss CE-1 Chorus Ensemble

Amplificador:
- Marshall Major 200W
Com um caixa Marshall 4x12 com alto-falantes Celestion originais de fábrica.

John Frusciante, Flea, Chad Smith e Josh Klinghoffer - Federation Square - 2007




Guitarras:
1962 Fender Stratocaster
1961 Fender Stratocaster - apenas presente, não usada na apresentação.

Pedais:
- Boss DS-2 Turbo Distortion
- Ibanez WH-10 (V1)
- Digitech PDS-1002
- Line 6 FM-4 Filter Modeler


Amplificador:
- Marshall Major 200W
Com um caixa Marshall 4x12 com alto-falantes Celestion originais de fábrica.

Ataxia


Guitarras:
1962 Fender Jaguar
1963 Fender Telecaster

Pedais:
- Boss CE-1 Chorus Ensemble
- Electro-Harmonix Holy Grail Reverb
- Line 6 DL4 Delay Modeler






Sintetizador:
- Doepfer A-100

Amplificadores:
- 1960s Fender Bassman
- VOX AC30
- VOX ???

Os Discos Favoritos de John Frusciante - On The Record de 2004


Guy Oseary: Quais são alguns de seus álbuns favoritos?



Estou nomeando aqueles que eu amo, mas posso citar outros quinhentos que eu amo da mesma forma. Especialmente de bandas como o Velvet Underground ou do The Mothers [of Invention], eu amo muitos de seus álbuns da mesma forma. Eu só estou tentando escolher um por banda.




(GI), the Germs
Trout Mask Replica, Captain Beefheart and the Magic Band
Low, David Bowie
The Least We Can Do Is Wave To Each Other, Van Der Graaf Generator
The Velvet Underground, the Velvet Underground
Not Available, the Residents
Cut, the Slits
The Ekkehard Ehlers Plays series, Ekkehard Ehlers
Raw Power, the Stooges
Hark! The Village Wait, Steeleye Span
Closer, Joy Division
The Idiot, Iggy Pop
Adolescents, the Adolescents
What Makes a Man Start Fires, Minutemen
I Say, I Say, I Say, Erasure
Penthouse and Pavement, Heaven 17
Fireside Favorites, Fat Gadget
Burning from the Inside, Bauhaus
Over the Edge, the Wipers
The Slide, T.Rex
Remain in Light, Talking Heads
Burnt Weeny Sandwich, Frank Zappa and the Mothers of Invention
Travelogue, the Human League
Desert Shore, Nico
Slayed?, Slade
Funkadelic, Funkadelic
Red Medicine, Fugazi
Barrett, Syd Barrett
Here Come the Warm Jets, Brian Eno
Black Celebration, Depeche Mode
Red, King Crimson
Trilogy, Emerson, Lake & Palmer
Close to the Edge, Yes
’75, Neu!
Flammende Herzen, Micheal Rother
Get Out, Pita
Plus Forty Seven Degrees 56’ 37” Minus Sixteen Degrees 51’ 08”, Fennesz
Liege and Lief, Fairport Convention
Led Zeppelin IV, Led Zeppelin
The New Yor Dolls, the New York Dolls
The Ramones, the Ramones




Do Livro "On the Record: Over 150 of the most talented people in music share the secrets of their success" lançado em 2004, por Guy Oseary.



CURIOSIDADE:

Em 1993 a coleção de discos de John Frusciante era de 2.000 álbuns - até que todos foram destruídos por um incêndio na sua casa. Em 2003 quando perguntado se ele tem ideia do número de álbuns e de tão grande é a sua coleção de 1997 até então - John respondeu: "Eu não percebi isso, talvez algum dia eu faça uma estimativa."
Guitarist Magazine (UK) - Junho de 2003


As Músicas Favoritas de John Frusciante - On The Record de 2004





“Lady Grinning Soul,” David Bowie
“The Musical Box,” Genesis
“Forensic Scene,” Fugazi
“The Trees They Do Grow High,” Joan Baez
“Holiday,” the Bee Gees
“Ride into the Sun,” Lou Reed
“Drugs,” Talking Heads
“Black Angel’s Death Song,” the Velvet Underground
“Wonderful Woman,” the Smiths
“White Queen,” Queen
“Epitaph,” King Crimson
“Frankenstein,” the New York Dolls
“Today Your Love, Tomorrow the World,” the Ramones
“Free Money,” Patti Smith
“Girl,” T.Rex
“Remember (Walking in the Sand),” the Shangri-Las
“Duke of Earl,” Gene Chandler
“Snow Blind,” Black Sabbath
“Police Story,” Black Flag
“Presence of a Brain,” Parliament
“Maybe,” the Chantels
“Be My Baby,” the Ronettes
“I Feel Love,” Donna Summer
“You’re So Fine,” the Falcons




Spotify:





Do Livro "On the Record: Over 150 of the most talented people in music share the secrets of their success" lançado em 2004, por Guy Oseary.


19 de julho de 2016

1961 Fender Precision

Fender Precision Bass de 1961, ele já foi usado por Flea em apresentações em 2004.


Esse baixo pode ser ouvido em "Dark/Light" do álbum The Empyrean, lançado por John Frusciante em 2009.

1961~1975 Fender Bass VI

Fender Bass VI de algum período entre 1961 e 1975

"Eu toco um Fender Bass VI nessa música ["Fanfare"] – e uma Strat, eu acho. O Bass VI é um baixo que se sente como uma guitarra. As cordas não são tão separadas, e tem um som mais de guitarra, em comparação com outros baixos. Você pode tocar acordes abertos – qualquer coisa você pode tocar com um som agradável de guitarra nele. A guitarra de “Fanfare” é uma progressão de acordes bem básica, em comparação com a maioria das coisas que eu faço, mas tocar no Bass VI a mesma coisa que eu toquei na Strat deu a ela um som mais pesado que deixou mais difícil para meus ouvidos decifrar exatamente que acordes eu estava ouvindo. Você não está acostumado a ouvir esses acordes uma oitava abaixo."
- Premier Guitar - Março de 2014

18 de julho de 2016

Universalmente falando - Junho de 2003


UNIVERSALLY SPEAKING

A Guitarist vai aos bastidores para encontrar o Chili Pepper John Frusciante, responsável pelo melhor álbum de guitarra deste ano. Venha conosco descobrir: por que ele ainda não consegue ouvir seu disco; como ele reconstruiu seu arsenal de guitarras, logo após sua antiga coleção ser destruída pelo incêndio em sua residência; como ele aproxima a teoria de acordes e como solar; e por que nós o ouviremos muito nos próximos meses.

Além do mais, Ben Bartlett conversa com Dave Lee, técnico de guitarra de John, para saber como é a técnica de seu trabalho. Aprecie sem moderação com a tradução majestosa de Osmar D. M. da Silva, que se disponibilizou a colaborar com o acervo da John Frusciante effects junto ao Universo Frusciante.


“Pra ser sincero, eu demorei muito tempo para
perceber que By The Way estava finalizado”

"STANDING IN LINE TO SEE THE SHOW TONIGHT, AND THERE'S A LIGHT ON HEAVY GLOW" BY THE WAY

São 20 horas da noite, e estamos, em pé, na fila, com os olhos vidrado no único caixa eletrônico da Manchester Evening News Arena. A fila cresce, quase até alcançar toda a área do lobby da arena, contendo os mais diversos tipos de pessoas, perguntando-se se algum dia entrarão ali, quem sabe no Bar.

Esta noite, o lugar está fulgurante pelos amantes de música. Jovens punks com suas correntes barulhentas. Velhos rockeiros com seu couro surrado. Esbeltos New-Wavers com jeans preto como segunda pele. Adolescentes de olhos brilhantes ficando bêbados como numa festa da escola. Executivos de trinta e poucos anos, descolados e na moda. Alto, baixo, negro, branco, loiro, vermelho, fervoroso e tranquilo, todos estão aqui. Isto porque a maior banda de rock do mundo está na cidade e, basicamente, todo lugar é aqui.

Neste momento, o apelo universal pelos Red Hot Chili Peppers é espantoso. Para uma banda que, uma vez famosa, passou a vestir nada mais do que uma meia em seus pênis, tendo sido marginalizada como jagunços sexistas de rap-metal, a sua transformação em campeões de vendas, namoros com modelos famosíssimas, e melhores do mundo, parece inacreditável. Entretanto, basta olhar um pouco a montanha-russa que a carreira dos Red Hot Chili Peppers atravessou nesses 20 anos e logo fica evidente que há um, ou melhor, quem é o responsável por estes altos e baixos.

Quando John Frusciante entrou para a banda, em 1988, eles já estavam em atividade há cinco anos, haviam gravado três álbuns medíocres e mostrando pouca perspectiva de melhora. Evidentemente, Flea tinha um talento incrível e Anthony Kiedis era um líder memorável. Contudo, a inspiração musical, e o foco na melodia, eram mais medíocres ainda.

Entretanto, os efeitos do ingresso de John eram continuamente percebidos, sendo o quarto álbum, Mother’s Milk, acompanhado das primeiras faixas “transmissíveis” na MTV, como "Higher Ground" (de Steve Wonder) e "Knock me Down", levando a banda a um contrato de alto nível com a Warner Bros. Devido a isto, o álbum seguinte, Blood Sugar Sex Magik, de 1991, vendeu milhões de cópias mundo a fora e, no espaço de três anos, Frusciante tornou os Chili Peppers as legítimas estrelas do Rock.

Em 1992, quando a tensão entre ele e Kiedis chegou a um nível insustentável, Frusciante deixou a banda. Sua vida tomou um rumo espiral de descenso pelo isolamento, introspecção e dependência em drogas. Similar a este descenso foi a carreira dos Chili Peppers. Demoraram dois anos, e quatro guitarristas diferentes, até definirem um substituto: Dave Navarro, ex-guitarrista do Jane’s Addiction. Entretanto, o álbum One Hot Minute, de 1995, era uma tosca imitação de seus sucessos anteriores. As coisas nunca foram ruins com Navarro, e sua saída, dois anos depois, pegou a todos de surpresa. Os Chili Peppers haviam chegado ao fundo do poço.

Em 1996, a heroína controlava a vida de John. Sua casa se incendiou, seus dentes apodreceram, seu corpo ficou todo marcado e sua mente era controlada por fantasmas e demônios. A morte bateu à porta. Somente um período numa clínica de reabilitação o salvou da morte certa, e ele saiu “limpo” das drogas em 1997, justamente para ser, de imediato, cortejado por seus ex-colegas de banda, que novamente precisavam de um salvador para resgatá-los das profundezas. John devidamente agradeceu o convite e, bingo, aqui estamos cinco anos e dois álbuns depois com o Chili Peppers de volta ao topo do mundo.

Cai a tarde e estamos nos bastidores, ainda aguardando a chegada de John. Composto de longos corredores brancos, piso rebocado com fitas adesivas luminosas, está o caminho até o palco, demonstrando que a área é sem glamour. Não há tietes esperando, não há bandejas cheias de drogas sendo, generosamente, distribuídas, nem mesmo sinal de modelos famosíssimas. Agora, os Chili Peppers são absolutamente profissionais, livres das drogas, deixando isto evidente.

O baixo Modulus de Flea que é usado no aquecimento é o mesmo
que ele usa no palco, enquanto que John prefere se aquecer com a Jaguar
antes de usar suas Stratos e Teles ao vivo no palco.
Dito isto, não é difícil encontrar seu camarim dentro das áreas em que estão os bastidores de descanso. Primeiro, pelo cheiro. Um inebriante aroma de incenso emana do interior, contrastando com o odor de maconha, típica de camarins da maioria das estrelas de rock. E então, há a iluminação. Uma névoa composta por vermelho e verde forma o ambiente, atmosférico, suave, e relaxante – justamente o contrário do flash gritante de luzes de neon que domina os outros lugares – sendo perfeito para rituais de meditação e alongamentos, que são partes importantes das rotinas de pré-show da banda.

E, para finalizar, unidos do lado de dentro, há o último ajuste, com o aquecimento instrumental de John e Flea, em dois belos trabalhos de luthieria: um contrabaixo Modulus personalizado, e uma Fender Jaguar alaranjada.


"THIS IS THE WAY I WANTED IT TO BE" DOSED

Ao passar por nós, Anthony Kiedis se atenta, olha em nossa direção e se encaminha com hospitalidade. Causando surpresa com sua baixa estatura (algo em torno de 1,70m), ele aparenta ainda ser uma estrela, com seu bronzeado saudável de Los Angeles, nem aparentando ter completado, recentemente, 40 anos de idade. Membros de apoio da banda The Mars Volta se dirigiam em sentido oposto, trajando seus belos e colantes couros pretos. Enfim, com uma hora de atraso, John Frusciante aparece.

Um pouco maior que Anthony, ainda assim mais baixo do que se espera, John nos cumprimenta calorosamente. Fomos avisados de que ele não gosta de ser fotografado. Então, para amenizar o processo, permitimos que ele pegue sua Jaguar, conecte-a a um pequeno amplificador Electro-Harmonix e inicie seu aquecimento mais cedo. Embora, ainda em tempo, assim que ele começa a deslizar pelo braço da guitarra, é possível notar a tensão desaparecendo. Devido a isto, no momento em que nos sentamos para iniciar a entrevista, ele demonstra estar relaxado e pronto para as perguntas.

Obviamente, começamos a falar sobre o enorme sucesso de By The Way, o Álbum de Guitarrista do Ano no ano passado. As linhas principais ultra melódicas e as harmonias vocais luxuriosas de John Frusciante comanda o disco e, considerando que John fez a segunda voz de todas as faixas, ele deve ter treinado muito sua voz.

“Sim, eu tenho um professor (de canto) e isto me ajudou a deixa-la (a voz) muito mais consistente”, ele começa dizendo, respondendo de forma até atrapalhada, muitas vezes deixando pausas aleatórias (e confusas) entre as palavras como se ele estivesse dando, a cada trecho, pensamento enfático.

“Fiz muita vozes no álbum dos Chili Peppers, mas em meu disco solo, acho que elevei meu canto a um patamar muito maior. No álbum dos Chili Peppers, apesar de cantar muito, pra mim, pareço muito comedido, por ter que me ‘enquadrar’ em um determinado plano. Além do mais, eu dupliquei as vozes, por isto não há muita personalidade nisto. Em meu disco não duplico nada. Há harmonias, mas somente duas ou três por vez. Portanto, eu ouço, de fato, a personalidade nas vozes que estão cantando”.

"O Livro Willie Wonka And
The Chocolate Factory traz acordes incríveis"
O disco ao qual John se refere, e que ele se mostra muito interessado em falar, é seu quarto disco solo, que deve ser lançado no ano que vem (2004). Com uma colaboração do talentoso músico Josh Klinghoffer (embora o disco seja lançado com o nome de John Frusciante), o disco contém músicas de John datadas da época de seu último disco solo, até as gravações de By The Way, além de contar com participações notáveis.

John continuou tocando sua Jaguar
Fiesta Red por toda nossa sessão de fotos.

“As músicas mais antigas do disco foram escritas no momento em que eu escrevia as últimas músicas para meu último disco solo,” – explica John – “mas elas, obviamente, precisavam de bateria de verdade, e não elétrica, como as que eu utilizei naquela oportunidade. Mas, para este disco (a ser lançado), Chad (Smith, baterista dos Chili Peppers) tocou a bateria. Josh e eu compusemos as partes de bateria e Chad apenas aplicou seu estilo nelas, como um legítimo baterista, e fez um ótimo trabalho. Flea tocou o baixo em uma música. É sua primeira atuação em um disco meu, e ele fez um trabalho e tanto. Além deles, Omar (Rodriguez-López), do The Mars Volta, tocou slide-guitar em duas músicas”.


Assim como os outros discos solos de John, estes novos discos são mais experimentais do que seu trabalho com os Chili Peppers. Desta vez, vem à tona a atual paixão de John por música eletrônica e sintetização modular. “Há muita música eletrônica experimental neste disco” – afirma John – “porém, acompanhada de boas músicas. Os sintetizadores são muito utilizados de forma sutil – as música são compostas, basicamente, por violão, bateria e baixo, com o complemento de Mellotron, ou sintetizadores e sons eletrônicos aqui e ali. A forma como (o disco) foi gravado tem muito mais vida do que qualquer coisa que já fiz. Toda a gravação foi feita seguindo uma estética. Os microfones que utilizamos são antigos, e boa parte da bateria foi gravada em uma fita 8-Track (Stereo 8), para então ser passada para 24 canais. Todos os esforços foram concentrados para criar sons agradáveis, para que tivessem a mesma vibe e a mesma simpatia que as músicas dos anos 60 e 70. Este é o sentimento que tentamos embutir no disco”.


Na verdade, sua atuação prática em seu trabalho solo, bem como sua crescente confiança em mixagem e engenharia musical, levaram-no a questionar o produtor Rick Rubin sobre o tratamento que este deu ao álbum By The Way – considerando que, neste momento, Rick Rubin acha difícil pensar em um novo álbum para os Chili Peppers.


“Pra ser sincero, demorei muito tempo pra perceber que By The Way estava finalizado”, disse John, exprimindo um misto de frustração e tristeza em seu olhar. “Em meu disco, você perceberá que não há nenhum som muito alto. Pra mim, foi isto que me manteve interessando em continuar sua criação. Não quero que as músicas sejam só de vocais, mas também não sou paranoico ao ponto de desprezar os vocais. Rick (Rubin, produtor dos Chili Peppers) mixa bem os vocais altos e equaliza qualquer coisa que combine com a entonação vocal, de modo que nada fique fora da equalização.



Eu ainda não consigo ouvir nosso último disco por causa disso; as mixagens bagunçam minha mente. Pela primeira vez, Rick foi tão legal que me deu algo pra fazer no processo de mixagem, onde contei a ele sobre a dificuldade de trazer uma harmonia perto da outra, dentre outras coisas. Mas, o melhor, estava por conta dele. Contudo, com o passar do tempo, desenvolvi minhas próprias opiniões em relação à mixagem, tanto que, em meu disco, você verá que ele é diferente dos anteriores, e eu espero que o próximo disco dos Chili Peppers seja mais parecido com o meu.



Finalizar meu disco solo me trouxe paz interior, pois me deixou 100% orgulhoso. Com o By The Way há muitas coisas que eu queria que fossem diferentes, e eu não posso fazer nada, entende? Não me conformo com isto”.



Felizmente, John teve a oportunidade de “fazer as pazes” com diversas faixas (de By The Way) que foram extraídas para singles. “Nós remixamos "Can’t Stop" para o single e gostei demais desta nova versão” afirma John. “Fizemos um remix de "Universally Speaking", pois estão pensando em lançá-la como single, e eu adorei sua nova versão também. Quando temos oportunidades como estas de remixar músicas, eu as deixo como quero. Acho que ainda não tinha redefinido minha habilidade de confiar em meus instintos sobre isto (mixagem). No entanto, eu só estava acostumado a criar as faixas e deixar que o Rick as mixasse, deixando-o trabalhar nelas e me sentindo feliz com isto".


"THROW AWAY YOUR TELEVISION, TAKE THE NOOSE OFF AMBITION" THROW AWAY YOUR TELEVISION



"Meu enfoque agora vai bem mais além que 'tocar guitarra'". Hoje em dia, John Frusciante é um homem completamente imerso na música. Ele a vive, respira-a, alimenta-se dela e dorme com ela. E, além de dormir, ele sonha com a música. Seu conhecimento por música é enciclopédico, e sua sede por isto é insaciável. Leve-o até o assunto de seus recentes artistas favoritos e a gama de estilos e gerações que eles abrangem é impressionante. "Eu estava ouvindo algumas dessas músicas eletrônicas bem abstratas que vêm sendo feitas agora", John vai falando, com um entusiasmo nítido.



"Rose Parlane, Pita, e um cara chamado Fennesz. Ele é um grande guitarrista também, e todos os seus discos são muito bons e totalmente distintos. São musicas abstratas sem nenhuma batida. O compasso musical é muito diferente, e tudo isso soa interessante pra mim. Eu também escuto muito folk, como Joan Baez, Fairport Convention e Steeleye Span, além de músicas como as de King Crimson, Emerson, Lake & Palmer, Mott The Hoople e Slade. Sou 'ligado' no mundo. Tenho apenas a arte que aprecio, e a música que gosto, e, pra mim, este é o mundo".



Tendo algo mais que 2000 até uns 10 anos atrás, John conta que, hoje, ele não tem ideia de quantas unidades tem sua coleção de discos. "Ainda não contei, mas, quem sabe um dia, eu o faça". Com certa demora, e o contínuo fluxo de membros da imprensa, John ainda tem que nos conceder o favor de arranjar tempo para nos contar sobre sua obsessão por LPs ("bolachões"). "Há algumas semanas atrás, quando eu estive na Espanha, uma garota conseguiu as chaves da loja se discos de seu pai e a manteve aberta das 2 às 6 da manhã. Aquilo foi muito divertido", conta ele. "Isto fez com que eu perdesse a noção do tempo e acordasse muito tarde. Meu dia, como um todo, consiste apenas em algumas horas de prática musical, aquecimento da voz e coisas desse tipo".



A aquisição de guitarras trouxe grande dificuldade à John, que perdeu seu arsenal há alguns anos em um incêndio em sua residência, fazendo-o reiniciar sua coleção do zero. A Jaguar que ele posou para a foto desta capa foi a primeira da nova coleção. "Comprei-a em uma loja de guitarras, acho que na Voltage Guitars da Sunset, em 1997. Eu não tinha nenhuma, então consegui um pouco de dinheiro, e esta guitarra foi meu próprio presente de Natal. Aí, quando o pessoal da banda falou comigo sobre voltar, eu falei da minha necessidade por uma Stratocaster. Nisto, Anthony me emprestou um pouco de dinheiro e fomos a Guitar Center, e eu comprei uma com braço de rosewood. É uma ano 1962 e foi usada em quase todas as faixas do By The Way".



A única exceção de destaque foi a faixa "Tear", na qual John usou sua Gretsch White Falcon antiga. Ele obteve esta guitarra em especial com a ajuda de seu grande amigo, ator e músico, Vincent Gallo. "Exato, Vincent encontrou uma dessas pra mim. É uma ano 1957 [Nota JF effects: na verdade se trata de uma 1955], e costumava ser dele, mas acabou a vendendo para alguém que ele teve que comprar de volta. Ele é um grande articulador e negociador, sabe?", conta John, sobre o amigo. "As pessoas o conhecem como ator e diretor, mas sua verdadeira ocupação é como articulador e negociador!", John sorri, enquanto fala. "Ele negociou com o cara e fez drama para ter a guitarra de volta".



Você queria a guitarra por ser bonita? "Não! Eu queria uma dessas pois Mattew Ashman, guitarrista do Bow Wow Wow, usava uma. A dele não era dos anos 1950, era dos 1970, e era por isto que eu queria a guitarra. Naquela época Mattew e Bernard Summer, do New Order, eram os dois guitarristas por quem eu era fascinado".

John usou outras guitarras durante as gravações de By The Way, mas estas faixas não foram para a versão final do disco. "Tínhamos outras músicas de rock que não integraram o disco pois, para distorcê-las, usei uma Gibson SG com um amplificador Marshall, que danificou a distorção", relembra John. "Pra mim, este é o último estágio da distorção de sons. Eu tenho uma bela SG de 1960 - que Vincent Gallo também encontrou pra mim - que tem uma P90 e isto é muito bom. Gravamos também uma faixa de 15 minutos chamada "Strumming in D on J". Literalmente, significa "Strumming in the key of D on the Jaguar" ("Dedilhando na escala de Ré em uma Jaguar"). Espero que possamos a integrar a outro disco, pois é uma bela música de funk".

Observadores minuciosos devem ter se surpreendido ao verem John tocando uma Fender Tornado no videoclipe de "Can't Stop". "Exato. O diretor me pediu para tocar com esta, exatamente por causa de sua cor. Eu não toco guitarras que não sejam dos anos 1960, ou de antes. Fora isto, não toco, mas, neste caso, não vi problemas nisso. Gostei do formato dela. E o diretor queria assim por causa da cor dela e, por ele ser um diretor/ditador, não tive como argumentar".


De Bow Wow Wow a Steeleye Span e Slade,
John possui um gosto musical bastante amplo.

"CAN'T STOP ADDICTED TO THE SHIN DING" CAN'T STOP



Caso você ainda não tenha compreendido, John é um cara muito ocupado. Logo, seus fãs adorarão saber que ele está trabalhando em dois outros projetos que podem ser lançados já ano que vem. O primeiro, é para Vincent Gallo, que pediu para John fazer parte da trilha sonora de seu próximo filme, Brown Bunny, pouco tempo atrás.



"Passei os últimos três anos compondo para este filme. Vincent me deu o roteiro e 'deixou comigo'. Fiz uma mistura de musicais e instrumentais, e eu não sei como tudo isto se encaixará no filme. Provavelmente, terei muita sobra de material que poderá ser útil para eu compor um novo disco. Tem muitas músicas tristes, uma vez que o filme tem uma história triste. Neste momento, Vincent está no meio da edição final do filme, e eu estou muito ansioso para ver como ficou".


O outro projeto é resultado de arranjos recentes de John e Flea em show, uma característica da atual turnê, e mostra a dupla retornando às suas origens musicais. “A partir do momento em que terminamos o By The Way, fui assistir a apresentação de The Mars Volta, que é muito influenciado por King Crimson”, John nos conta. “Então eu passei um período ouvindo as músicas de King Crimson e shows ao vivo do ELP. Isto aconteceu comigo pois, naquela época, essas bandas se superavam ao vivo, fazendo muitas improvisações, e as pessoas adoravam isto. Eles eram as maiores bandas do mundo, e estavam no palco fazendo diversos instrumentais que durariam por 20 minutos. Falei ao Flea, uma vez, que deveríamos fazer arranjos em boa parte do show, então nós fizemos e tudo tem saído muito bem. Este lado improvisador meu e do Flea está, provavelmente, se revelando cada vez mais agora porque estamos fazendo um disco todo instrumental com o Omar, do The Mars Volta. Nós estamos trabalhando nisto durante a turnê, e nos apresentaremos juntos muitas vezes nos próximos meses, então temos estes pequenos ensaios de arranjos depois dos shows.

"Durante a gravação do By The Way, Flea e eu estávamos em momentos diferentes, contrastando entre características diferentes de tempo, e harmonia, e o fato de tocar rápido. Omar (Rodríguez-Lopez) e eu intercalamos muitos trechos de guitarra, bem como Adrian Belew e Robert Fripp fizeram nos anos 1980. Quando Flea começou a tocar baixo, ele era muito inspirado por Allan Holdsworth, e, pra mim, isto era Rock Progressivo, assim como Mahavishnu Orchestra e The Tony Williams Lifetime. Logo, é daí que vem grande parte de nossa inspiração musical".

Sabendo disso, fica difícil dizer em quantos outros projetos John Frusciante se envolverá nos próximos meses. Sua ética profissional é incrível, e seu comportamento atual, bem como a forma como leva sua vida, são de grande aprendizado para todos. "Eu tento sempre aprender algo novo todos os dias. Às vezes, aprendo um solo de Jimmy Page. Outras vezes, músicas do Mingus. Existem dias que me dedico a aprender a trabalhar melhor com meu sintetizador. Mas também têm aqueles dias em que, e dedico a trabalhar bastante na mixagem de algo, bem como aperfeiçoar meu trabalho no estúdio.

Faço de cada dia uma experiência de aprendizado, ao invés de ficar pensando no que é que posso exibir para as pessoas, ou o que provar para o mundo. O aprendizado tem, como produto natural, o seu próprio resultado (o conhecimento), e isto sempre foi a principal coisa desde que comecei a aprender sobre guitarras: ser cada vez melhor".



Essa Jaguar foi a primeira guitarra que John
 comprou depois de todos os seus instrumentos
 terem sido consumidos pelo incêndio na sua casa.
ACO(O)RDOANDO: COMO JOHN FRUSCANTE AMPLIA SEU VOCABULÁRIO DE ACORDES


"Pra mim, os livros são a melhor fonte de aprendizado. Se seu ouvido não esta acostumado a identificar uma 6ª ou uma 9ª, ou qualquer outra escala, não adiantará focar só ouvindo. Comprei diversos tipos de livros de acorde há um tempo atrás. Aprendi muito com o livro de Charles Mingus e com o livro de acordes dos Beatles. Ambos os livros costumam ser interessantíssimos boa parte do tempo. Tenho livros de Burt Bacharach que possuem ótimos acordes. Os livros de Fiddle on the Roof e Willie Wonka And The Chocolate Factory trazem acordes incríveis, algo como nunca visto antes. Eu tento aprender tudo o que posso com livros como estes.

O segredo dos acordes é tocá-los um após o outro. Quando eu era adolescente, eu tinha um livro chamado Chord Chemistry, de Ted Green, mas ele jamais forneceu qualquer sentido ao contexto dos acordes. Existem infindáveis formas de tocar uma 7ª menor. Ao meu ver, todo livro de acordes precisa ser acompanhado de outro livro prático que aplique suas teorias e acordes. Um bom livro que encontrei se chama Grimoire Chord Encyclopedia. O bom disso é que ela tem uma página no fim onde consta o acorde e descreve os intervalos constantes nele. Desse modo, quando você compra seu livro do Charles Mingus ou do Charlie Parker, e começa a ler os acordes, assim que você encontra algum que desconhece os intervalos, você pode consultar em outras fontes.

É muito importante conhecer os acordes na prática. Um acorde de 9ª escala em pestana, passo o dia entre duas canções onde ele é utilizado da mesma forma: "Michelle", dos Beatles, e em uma música de Charles Mingus. A nota raiz era a base da melodia, e a 9ª a cinco casas abaixo do acorde. Então, naquele dia, eu compus uma canção com esta base.

Uma das minhas preferências nos acordes é o fato de poder ser um acorde simples, porém, a nota do seu baixo ser de outro acorde. Por exemplo, um acorde de Lá menor com a nota de baixo de Si. Ou, no caso de uma série de acordes, se você está tocando um Lá menor com a nota de baixo de Mi, e não de Lá, isto faz com que o acorde seja bem diferente (no aspecto criativo)."


SOLOS SIMPLES?

John Frusciante e sua concepção de solos para o By The Way:

"Eu, como guitarrista, quando gravamos um disco, penso demais em como simplificar tudo ao máximo possível. Eu ia tendo as ideias para as melodias baseado no estilo de Kraftwerk. O modo como eu ouvia os sintetizadores criando as melodias melhor que os guitarristas. Michael Rother, da banda Neu!, que também criou ótimos discos de solo, tem um modo de tocar muito influente ao modo como toquei em By The Way, onde cada nota tem sua posição perfeita, escalado e construindo o que a nota anterior iniciou.

E então se usa algumas notas de 16 escalas. Esta é minha ideia para os solos. Muitas vezes, o que o bom guitarrista faz é tocar um grupo de notas em que você ouve a sensação que estas criam, acontecendo de forma muito rápida, assim como Jimmy Page queria fazer. Eu, pura e simplesmente, não queria fazer isto em By The Way".

PONTOS QUENTES

1// Enquanto gravava o By The Way, John ouviu os dois primeiros discos de The Human Leagues, e os discos de Reproduction or Travelogue, à caminho do estúdio;

2// As lendárias sessões de arranjos musicais que Flea e John fizeram no Three Amoebas, infelizmente, não serão lançadas, pois parece que John perdeu as fitas;

3// Os sons acústicos que se ouvem em By The Way foram feitas com um (violão) Taylor, pois Rick Rubin, o produtor do disco, gosta deles. Já John não é muito fã destes, preferindo os Martins;

4// John ainda deseja comprar uma Gibson Les Paul, ano 1959. Porém, ainda não encontrou nenhuma.


BLOOD SUGAR TÉCNICO MAGIK

O técnico de guitarra Dave Lee nunca perde um show dos Chili Peppers. Ele não pode se dar ao luxo, ele é o homem responsável por toda parafernália de John Frusciante.

Em 1988, o baixista Dave Lee usava seu tempo trabalhado com construção (civil). Mas, no momento em que quase perdeu o polegar em um acidente, ele percebeu que era hora de mudar...


E então, Dave, como você começou nisto?

Naquele período, eu tinha um amigo que trabalhava para o RATT como técnico de guitarra, ele sugeriu que eu ingressasse nesta profissão. Ele me escalou para trabalhar com a banda King Diamonds e eu comecei a ajudá-los como o sistema de monitoramento (sonoro). Então, quando demitiram o técnico de contrabaixo, percebi a grande oportunidade.

Quando esta turnê terminou, um outro amigo meu que tinha um estúdio em North Hollywood, me convocou junto ao cara que dirigia o Faith no More. Eles ainda não tinham se decidido. Então, comecei a trabalhar para eles e com o diretor, que também dirigia outras bandas. Então eu o acompanhei pelas mais diversas bandas.

Nesse meio tempo, um cara com quem eu tinha trabalhado começou a trabalhar nos Chili Peppers com o Flea. Dave Navarro não tinha nenhum ajudante na época pois seu técnico estava trabalhando com outra pessoa depois do término do Jane's Addiction. Então ingressei na banda e passei a ajudá-lo por um tempo como seu técnico. Foi então que Dave saiu e John Frusciante voltou e eu permaneci por aqui.

O que você faz quando a turnê termina?

Pelos últimos quatro anos e meio, os Chili Peppers estiveram muito ocupados, tendo eu pouco tempo de descanso. Trabalhei com o John em estúdio também, ajudando em seus discos solos e em shows. Ele fez shows acústicos com o disco To Record Only Water for Ten Days, e John é um cara que adora trabalhar, mantendo-me empregado o tempo todo. Sinto-me abençoado por isto. A atmosfera de trabalho dos Chili é ótima. Eles são muito inteligentes e estão além da classificação de "rockstars".

Como os outros membros dos Chili Peppers se sentem sobre a carreira solo de John?

Sempre estiveram muito ocupados, então ficam felizes por John se manter trabalhando enquanto eles têm um período de descanso.


Quais os tipos de coisas que um técnico faz no dia a dia?

Dave Lee realizando a tripla checagem na afinação da
1963 Fender Telecaster de John.


Muitas vezes, trocando e ajustando cordas. Eu troco as cordas de cada guitarra em cada nova apresentação. As guitarras do John são todas comuns, e eu tenho um método particular de travar as cordas na tarrachas Kluson.

John toca com muita força, então tenho que garantir que as cordas estejam bem esticadas. Não temos muitos problemas, considerando que a maioria de seus equipamentos são antigos. Utilizo três afinadores de guitarra: um Peterson Virtual Strobe, um BOSS TU-12 e também um Korg. A precisão é fundamental, né?

Como é o Setup (configuração de pedais) do John?

Repleto. Alguns guitarristas utilizam poucos pedais. Mas ele usa muitos.
Essa guitarra é uma Gretsch White Falcon de 1955
(avaliada em aproximadamente 17 mil doláres).
John simplesmente não toca com as novas elétricas...

Então, como é um dia típico de trabalho pra você?

Após cada show, vou conversar com o John, e pergunto a ele sobre qualquer coisa em particular que ele tenha notado que necessite mudança ou melhoria. Preparo todos os seus equipamentos e verifico sua afinação durante o dia. A banda não faz passagem de som, talvez apenas uma vez em meses. Apenas instalam os equipamentos e tocam, a menos que surja algum problema acústico que precise ser reparado. Geralmente, não passam o som.

...Mas ele usa um Taylor 314ce acústico, ao vivo. Em todas as guitarras são usadas as correias pretas Levy's e o straplocks da Schaller. Que tipo de corda John usa? Ele usa as D'Addario, .10 mas usa uma .11 na corda E aguda.
Parece que John anda dando as cartas nesses novos discos?

Muito disto vem do fato de as pessoas realmente confiarem na opinião dele. John tem noção do que é uma boa ideia e do que não é, logo confiam nele. Há muitas bandas que não acho que são boas, e é bom ver uma banda que realmente toca, e muito bem.

Qual o setlist atual?

Essa maltratada e espancada é uma 1962
Stratocaster - é a guitarra favorita de John Frusciante
Logicamente ele toca músicas dos seus três últimos discos com os Chili Peppers, mas também há muitos arranjos recentemente. Ele se aventura no estilo similar ao de James Brown. Eles se divertiram muito em Londres, pois todos os grandes ídolos do John estavam lá. Radiohead, Jeff Beck e Jimmy Page estavam lá, o que fez com que John "viajasse" por todos os seus estilos.

Foi muito legal, porque, no meio de um solo, era possível ouvir "The Train Kept a Rollin'", dos Yardbirds, bem como todo tipo de coisa. Geralmente, Flea, John e Chad improvisam entre as canções.

Geralmente, é o Anthony quem define o setlist, então eu acompanho o John através desta sequência para garantir que ele use a guitarra certa em cada música. Por exemplo, em "Soul to Squeeze", ele prefere tocar uma Stratocaster pouco antes de usá-lá, pois ele a toca com força, e precisa confiar que está devidamente afinada.

Temos também que garantir que a música anterior à esta seja tocada com uma Telecaster, para que eu prepare a Stratocaster à tempo. O único momento que surge um problema é quando, subitamente, mudam a ordem prevista e fazem algo inesperado.

Frusciante usa uma 1955 Stratocaster com o braço
em maple para as músicas que necessitam de um timbre
mais brilhante.
Dá medo ver o John tocando seus instrumentos antigos com tanta força, todas as noites?

Fico tentando convencer o John a tocar aquelas réplicas de guitarra que a Fender faz, mas ele gosta da "vida" que os instrumentos antigos têm: a histórias que eles têm e tudo o que já tocaram. Mas Flea tem um baixo daqueles Jaco Pastorius, que é uma réplica. Cada pedacinho dele é igual ao original.

Enviei à Fender Custom Shop (Loja de Personalizações da Fender) algumas fotos da Stratocaster ano 1962 do John, pois há um cara chamado Jake que trabalhou no estúdio conosco, e que queria uma guitarra igual àquela. Então, ele queria que a Fender fizesse uma pra ele. Pra mim, parece um belo modelo a se construir.




DAVE LEE E OS AJUSTES NOS SETUPS DOS O CHILI PEPPERS

Com uma pedaleira como esta John terá uma boa prática
das aulas de dança que ele começou recentemente!

"Todos, exceto Chad, utilizam retorno de som auricular. Assim, todos podem ouvir perfeitamente o que produzem, e eu também. O que ouço é o mesmo que John, podendo assim reparar, de imediato, qualquer problema com o som. Lembro-me no Woodstock (1999), antes de utilizarmos o retorno, que ele não tinha noção da altura do volume do que ele produzia.

Quando começamos a participar de festivais e coisas do tipo, ele queria se movimentar livremente pelo palco, e ele carrega na guitarra um cabo enorme. A partir de um determinado comprimento, começávamos a perder sinal, então recorremos ao sistema de captação sem-fio da Shure.

Quando regressou à banda, John ainda não pulava de um lado para outro no palco, mas, uma vez, ouvi ele dizer que começou a dançar e que começou a tropeçar pelo palco. Portanto, o sistema sem-fio o ajudou e muito na movimentação.

Recentemente, Flea também aderiu à este sistema sem-fio, e tudo funciona muito bem para nós".



Marshall Jubilee 100 (à esquerda)  provido de crunch,
enquanto o 200W Major está no clean power.
AMPLIFICADORES PARA O ROCK

"John utiliza um amplificador Marshall Major de 200W com tubos KT8 e um Silver Jubilee, juntos. Eles são ligados simultaneamente através de um pedal Boss Chorus (Emseble CE-1), onde o sinal entra por um canal (mono), e sai em dois canais de som (estéreo).  Então, dessa forma se o chorus está ligado ou não o sinal fica dividido para os dois cabeçotes. O Silver Jubilee trabalha com um pouco sujo no modo que usamos.

Os cabeçotes do Marshall Major são muito difíceis de se encontrar. Conseguimos encontrar somente três, e conhecemos um cara chamado Mike Hill, que trabalhava na Marshall, e ele nos contou que eles fizeram apenas cerca de 100 destes amplificadores, entre 1969 e 1973. Eles são especiais pois, a 200W, você tem um som bem alto e ainda assim limpo. Basicamente, é como um amplificador para contrabaixo.

John toca muitas coisas que não possuem crunch. Distorções e overdrives vêm do som da guitarra, passando pelos pedais. Se algo der errado, e eu tiver que trocar o cabeçote do Marshall, quando o coloco de volta à operação, é preciso regulá-lo novamente.

Não adianta apenas memorizar a posição dos knobs, pois os auto-falantes são ligados via jumper. Então, a entrada do som precisa a ser devidamente ajustada, ou ficará distorcida, ou nem mesmo audível. É preciso ligá-lo por quatro vezes para encontrar o ponto certo de ajuste. Era o que eu fazia há pouco tempo".


DICAS TÉCNICAS

1// Utilizo baterias em todos os pedais pois, deste modo, eles trabalham de forma mais silenciosa. Testo-as diariamente e, caso estejam com menos de 9.1 volts, jogo-as fora. Tento não jogar as que estão em perfeito estado, para preservar o ambiente. As baterias trabalham bem entre 9.5 e 9.6 volts. Os MXR Micro Amp não usam nem um pouco da bateria [O consumo desse pedal e de 2,5mA];


2// Todo o circuito é cabeado com Monster Cable. Seu som é muito bom;

3// Lubrifico os captadores e a alavanca de ambas as Stratocasters com um produto chamado Guitar Grease. É parecido com um gel. Eu usava teflon, mas esta graxa é bem melhor. John usa muito a alavanca. Se eu não utilizar este produto, John não poderá usar a alavanca como ele a usa.




PALHETANDO



"John utiliza palhetas Jim Dunlop 0.60mm. São alaranjadas. Há uma história divertida com essas palhetas. O cara que as confecciona perguntou se John queria personalizar uma, e John achou graça daquilo, como sé fosse um pequeno fã de uma estrela do rock, entendeu?


Então, quando estávamos na América do Sul, em um aeroporto, e um menino, muito fã da banda, olhou pra mim, e disse: 'Você é Dave Lee, o cara do John.' A história chegou ao cara que fabrica as palhetas, que fez algumas delas pro John".

Artigo assinado por: Phil Ascoot

Tradução: Osmar D. M. da Silva
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